Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho); David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels), Pedro Cardoso (o Apóstolo), Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge) e Geraldo Guimarães (Gerry).

Dizzy Gillespie no Brasil, 1956 - Série, por Arlindo Coutinho

12 julho 2004

I.
Desde que veio ao Brasil pela primeira vez, quando esteve no Rio de Janeiro entre 6 e 12 de agosto e em São Paulo de 13 a 17, Dizzy Gillespie já era um dos meus ídolos e jamais poderia imaginar que a partir de então surgiria uma amizade pessoal entre nós que duraria até sua morte em 1993.

Apresentei-me a Gillespie em um coquetel em sua homenagem, antes de sua apresentação na TV Tupi, que contaria com a participação de todos os ali presentes. Músicos e jazzistas estavam a postos quando, aos primeiros acordes de "The Champ", um músico que estava ao meu lado deu um salto e caiu no chão, dando um susto na platéia. Dizzy deu uma olhada e prosseguiu em seu solo, enquanto juntavamos os cacos emotivos do trompetista Clélio Ribeiro, que também a partir dessa, tornou-se seu grande amigo.

Encerrada a apresentação na TV, fomos conversar com os músicos, Clélio e eu em particular com Dizzy, no nosso primeiro papo informal. Lá pelas tantas estávamos Benny Golson, Gillespie, Clélio e eu falando longamente sobre o Rio e suas belezas quando Dizzy, dispensando a condução disponível, perguntou-me: "O bonde passa por aqui?"

Respondi que sim, que o mais próximo dali era o da Linha 4 - Praia Vermelha e que passava em frente ao Hotel Glória, onde a banda se hospedava. E Gillespie disse: "Então, vamos lá!"

Caminhamos pela Avenida Portugal e pegamos o 4. Gillespie, ao invés de sentar-se, como os demais passageiros, cumpriu todo o percurso pendurado no estribo, tendo antes tido o cuidado de deixar seu instrumento, um Martin, aos cuidados do motorneiro.

No hotel, a conversa se estendeu até tarde. Clélio saiu antes porque tocava no Brasil Danças, mas fez questão de convidar Dizzy para dar uma passada lá, o que não aconteceu.

Seguimos com nosso papo sobre jazz, falamos sobre a era do swing, do bop, bastante descontraídos, quando chegou Quincy Jones, então com pouco mais de 20 anos, querendo saber o horário do ensaio no Teatro República. Já passava de meia-noite e a banda tinha sua estréia oficial marcada para aquele dia. Quincy, alegando estar gripado, subiu para seu quarto.

Estavamos retomando a conversa quando Dizzy perguntou-me, à queima-roupa: "Você joga xadrez?"

Eu lhe disse que jogava muito mal, mas ele insistiu, disse que queria jogar depois do ensaio e que era para que eu levasse um tabuleiro e as peças para que jogássemos em seu camarim. Lá fui eu, mais tarde naquele dia, para o camarim do República com o tabuleiro e tudo o mais, pronto para levar várias surras de Gillespie, o que de fato aconteceu.

O concerto estava marcado para as 20:30 mas começou com meia hora de atraso porque Dizzy e eu estávamos trancados no camarim terminando uma partida, apesar do desespero doss produtores. Finalmente Gillespie levantou-se e me disse: "Termine sempre aquilo que começou, nada pode ficar pelo meio do caminho..."

Quanto ao concerto, foi um dos melhores que já vi em minha vida. O repertório ia de "Groovin' High", "Tin Tin Deo", e "The Champ" aos standards "Beguin the Beguine", "I Can't Get Started", "Stella by Starlight" e uma grata surpresa, "Jessica's Day", de Quincy Jones, sua primeira composição, dedicada à filha de Nat Hentoff.

Quanto à qualidade dos músicos, todos sem exceção eram fantásticos. Mas o que me impressionou mais nessa primeira noite foi o solo, ao sax-barítono, de Marty Flax em "Doodlin'", composição de Horace Silver. Flax, com o timbre de seu instrumento e criatividade ímpar, esteve simplesmente insuperável, foi sem dúvida o número um da noite.

Fim do concerto, rumei aos camarins quando Benny Golson me chamou e disse: "Vejo você e Dizzy sempre juntos e me parece que são amigos de longa data...", ao que lhe respondi: "Que nada, conheci Gillespie aqui no Rio há pouco tempo!" E ele retrucou: "Mas se são grandes amigos, por que você não o chama pelo primeiro nome?"
Desse dia em diante passei a chamar Gillespie simplesmente de John.

Chagando ao camarim de John, uma multidão de fans se acotovelava na porta desejando falar com aquela figura alegre, que, com muita paciência atendeu a todos, durante mais de uma hora, naquele pequeno espaço. Eu podia ouvir, do corredor, as gargalhadas e os gritos de John rodeado de pessoas que não tinham a menor vontade de deixar o camarim. Quando tive uma oportunidade, entrei. Ao me ver, chamou: "Hey you (havia esquecido meu nome), give me a hand: take care of my wife because it's a big mess here."

Foi quando conheci Lorraine Gillespie, companheira de toda a vida daquela notável figura. Passamos a entabular uma boa conversa, e ela me disse que mesmo com o passar dos anos, John continuava cada vez mais irrequieto. Então lhe respondi: "Ms. Gillespie, seu marido é uma usina musical que gera energia por todos os locais por onde passa. Por isso seu apelido é Dizzy!"
Ela concordou mas disse que não sabia se iria resistir até o término da "tournée".

Nisso chegou John com dois amigos, agradeceu meu providencial socorro e gentilmente convidou-me para jantar. Recusei, dizendo que teria de acordar cedo para trabalhar e que tinha de recarregar minhas baterias para o concerto seguinte. Despedi-me e ia saindo quando aquele voz tronitoou novamente: "Hey you, say your name again!" Repeti meu nome todo, Arlindo Carlos Loureiro Coutinho e lhe disse: "Escolha um." Eu já ia pelo final do corredor quando John apertou o passo e me abraçou, dizendo: "I like you very much!"

Foi nesse dia 6 de agosto que tudo começou.

(continua)

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