Série: Histórias do Jazz
(final)
Após 38 capítulos desta série procurando passar
informações sobre a música de Jazz, como parte de sua história, estamos
encerrando e desejando que tenha sido útil de alguma forma aos seguidores deste
blog.
OUTRO LADO DO JAZZ # 20
CORPO E ALMA
Não é frequente que uma gravação
de música de Jazz se torne grande sucesso comercial. Algumas notórias exceções
ocorreram como no caso a seguir relatado.
Talvez a mais relevante delas foi
a de ― Body And Soul interpretada pelo saxofonista tenor ― Coleman
Hawkins em gravação de 11 de outubro de 1939 no estúdio da RCA Victor em
New York. Era uma balada até bastante banal assinada por 04 compositores: Edward
Heyman, Robert Sour, Frank Eyton e Johnny Green.
Aconteceu quando Hawkins
participava de uma gravação e ao final executou a canção sem maiores
pretensões, apenas para completar a sessão. Editado o disco pelo selo Bluebird subsidiário
“econômico” da RCA, Body And Soul aconteceu no momento certo para as
pessoas certas e a execução tornou-se um enorme sucesso.
Surpreendeu o próprio Hawkins que
estranhou e chegou a comentar: ― “Não sei o que viram nesta peça, é uma balada
e faço isto há anos e centenas de vezes!”.
Em 1958 o crítico e produtor
Leonard Feather calculava que Hawkins teria executado pelo menos umas 6.600 vezes
Body And Soul, nos 6.800 dias passados desde a data da gravação.
Body and Soul foi escrita
para a atriz e cantora inglesa Gertrude Lawrence, sendo interpretada
pela primeira vez por ela, ainda na Inglaterra. Libby Holman (*) foi a
responsável pelo lançamento da canção nos Estados Unidos. A primeira regravação
da canção foi feita ainda em 1930 pelo Louis Armstrong, que após o seu
lançamento alcançou o número 12 na parada de “singles” norte-americana. Até o
final da década, a canção havia sido regravada por 11 grupos.
Body and Soul continua a
ser um padrão de jazz, com centenas de versões cantadas e gravadas por dezenas
de artistas. Clássicas gravações vocais incluem as de: Ella Fitzgerald ,
Hanshaw Annette , Billie Holiday , Billy Eckstine , Etta James , Sarah Vaughan
e Frank Sinatra, e músicos como Benny Goodman , Lee Konitz , John Coltrane ,
Charles Mingus , Dexter Gordon , Sonny Stitt e Lester Young.
O disco fonográfico exerceu uma
espécie de ditadura sobre o mundo do Jazz. O sucesso imprevisto que uma
gravação podia proporcionar tinha às vezes consequências inesperadas para o
músico. Uma delas é que teria de repetir aquela execução infindavelmente, show
após show, e não podia variar muito, ou mesmo nada, pois o público ali estava
esperando para ouvir aquele mesmo solo do disco, ao vivo. Hawkins nos primeiros
anos repetia praticamente sua interpretação original nota a nota, mas depois de
20 anos já liberto executava a balada de forma diferente e até muito mais
charmosa. Enquanto viveu foi seu “Corpo e Alma”.
(*) Elizabeth Lloyd
"Libby" Holman (1904-1971) foi uma socialite, atriz e cantora.
UM PIRATA
BEBOPER
Existe uma série de gravações ao
vivo de Charlie Parker de qualidade bastante deficiente já que, afinal, já eram
os anos 40 e o processo Hi-Fi ainda não possuia razoável eficiência.
Acontece que tais gravações são
produto de um gravador pirata, feitas por um tal de Dean Benedetti, um
amador que usava uma máquina portátil e seguia os passos de Bird gravando tudo
o que podia.
Benedetti era um saxofonista de
pouca expressão que desde 1944 acompanhava Charlie Parker de clube em clube, de
concerto em concerto, gravando os solos de Parker e praticamente só os solos,
em um aparelho amador portátil.
Atuava com conhecimento e
permissão do músico já que acreditava que DEAN não usaria os registros de forma
comercial, o que realmente foi cumprido.
Vale citar uma passagem com DEAN
quando certa noite já preparado com seu gravador em uma mesa em frente ao palco
como habitualmente fazia esperando o início da apresentação de Parker, adentra
uma turma da fiscalização de direitos autorais e o proíbe de gravar o show. DEAN naturalmente desarmou tudo e saiu, mas
rapidamente retorna pela porta da cozinha do “night club”, vai até os
sanitários, suborna o encarregado que leva então o microfone até próximo ao
palco e o prende na cortina e escreve um cartaz “INTERDITADO” e o coloca na
porta de um "WC", onde sentado em uma privada DEAN passou o show
gravando com o aparelho no colo.
De início as grandes marcas de
discos só excepcionalmente se interessaram pela aventura de gravar ao vivo um
concerto bebop. Apenas pequenas
gravadoras assumiram o risco de gravar o "novo" Jazz. Se não fosse Benedetti grande parte do
início da obra de Parker e demais correligionários teria se perdido para
sempre. Mesmo assim foi por pouco porque Benedetti sumiu de repente após a
morte de Parker e com ele todas as fitas, só indo aparecer algumas delas pelos
anos 60, sem também muita informação e nem sombra do dito pirata, quando
finalmente foram editada
A Mosaic Records, editou uma
caixa MD7-129 com 7 CDs contendo as gravações de BENEDETTI.
3 comentários:
Grande série, MaJor, a qual acompanhei com muita atenção e interesse.
Grato por compartilhar seu conhecimento.
Edison
Trabalho brilhante, tanto extensivo como um verdadeiro intensivo pelo vasto panorama que você abrange nesta série. Qualquer agradecimento é pequeno, diante da grandeza do seu esforço em trazer pra cá seu vasto conhecimento a respeito, e com tanta coisa pra lá de interessante, sem ter a rigidez na escrita dos "catedráticos", o que torna a leitura leve e interessante para qualquer um que escolha aprender por aqui. Parabéns mais uma vez e obrigado por manter este blog vivo e atual. Forte abraço.
Mau Nah
Parabéns pelo constante e excelente trabalho
Sugiro que o site (blog) tenha um bom mecanismo de busca
Seria interessante classificar as matérias em TAGs
Abraços
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