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02 junho 2021

 

Série: Histórias do Jazz

 

 DO OUTRO LADO DO JAZZ # 4                                                                                                                     

DA CERA AO RAIO LASER (1)

Os processos de gravação em áudio surgiram e se desenvolveram em épocas aproximadamente contemporâneas com o próprio nascimento e formação do Jazz.   Os primeiros registros de sons em cilindros foram feitos em 1877 por Thomas Edison, contudo só por volta de 1890 apareceram as gravações de música em quantidade comercial e o maior desenvolvimento surgiu em 1902, com as companhias fonográficas Columbia e Victor.

O processo de gravação teve uma importância inestimável para o desenvolvimento, divulgação e refinamento do Jazz, já que um gênero musical com inteira liberdade de criação só poderia ser preservado através de seus registros sonoros.

Assim, o disco fonográfico representou muito mais que a simples gravação da música e, certamente, foi também um imperioso motivo para que grande parte dela fosse executada.

Outro aspecto é que os estúdios de gravação proporcionaram aos músicos um local descontraído informal que não era encontrado nas coxias dos teatros e casas de espetáculos.

Quantos e quantos músicos se conheceram ou se falaram apenas em um estúdio de gravadora?

A primeira oportunidade de gravação envolvendo a música de Jazz foi oferecida ao cornetista negro Freddie Keppard (*1890 †1933), mas este ficou receoso que outros instrumentistas viessem a copiar-lhe o estilo, dado que com tal novidade tecnológica poderiam imitar sua atuação, o quanto quisessem, isto foi em 1916.   Perdeu assim a música de Jazz a grande oportunidade de ser representada por um autêntico “jazzman” afro-americano em sua certidão de nascimento firmada pelo primeiro disco editado sob a chancela de música de Jazz.

Em fins de Janeiro de 1917 a  “Original Dixieland Jass Band”  foi convidada pela Columbia Gramophone Company para fazer uma gravação no estúdio que se localizava na Broadway em Manhattan.  Esse grupo formado por rapazes brancos oriundos de New Orleans, atuavam desde 19 de janeiro de 1916 com enorme sucesso em Nova York, no luxuoso Restaurante e Café Reisenweber, assim tudo levava a crer em novo grande sucesso, agora em disco.

Aconteceu que os técnicos da Colúmbia se espantaram com o tipo de música “hot”, até barulhenta em seus conceitos, acostumados que estavam com suaves conjuntos de cordas e, deste modo, não souberam interpretar e avaliar corretamente o que ali fora gravado e as ceras não foram aproveitadas para lançamento comercial, pelo menos à época.

A sessão histórica para o Jazz aconteceu, então, nos estúdios da Victor Talking Machine Company, em New York City e na tarde de uma segunda-feira, 26 de fevereiro de 1917, sob a responsabilidade técnica de Charles Soy.  As músicas eram Livery Stable Blues (Ray Lopez/Yellow Nuñez ) em uma face e, do outro lado, Dixieland Jass Band One Step (J. Russel Robinson/Nick LaRocca/Joe Jordan).

O disco foi editado comercialmente a 15 de março daquele ano com o n° 18.255 e vendido ao preço de 75 cents.

O sucesso desta música saltitante, ótima para dança foi enorme e as demais companhias seguiram os passos da Victor, como a Edison, Aeolian, Pathé, Okeh, Emerson, Paramount, Gennett e mesmo a Columbia que se recuperou rapidamente do mal passo dado anteriormente.

Contudo, muita coisa passou a ser gravada como Jazz, mas ou de qualidade inferior ou ainda sem a autenticidade requerida,   afinal nem todos os músicos possuíam o talento ou mesmo compreendiam o que seria de fato aquela novidade musical.

O destino e desenvolvimento do Jazz a partir das gravações tornou-se inseparável da evolução técnica e comercial da indústria do disco fonográfico.

Entretanto, antes mesmo da popularização do gramofone reproduzindo os sons da voz e dos instrumentos, o Jazz teve a chance de se apresentar através do invento da pianola, ou seja um piano que toca sozinho.

Tal processo mecânico, patenteado em 1897, é bastante engenhoso e baseia-se nas teclas empurradas por pressão de ar controlada por orifícios em uma bobina de papel, à medida que esta se desenrola sobre uma barra como eixo, sendo que, tais orifícios correspondem às notas tocadas no piano.

Pode-se imaginar que uma música assim reproduzida não teria nenhuma dinâmica, seria literalmente mecânica, linear,   ledo engano, já que aperfeiçoamentos posteriores permitiram que glissandos, trêmulos e figuras acentuadas de baixo (mão esquerda) puderam enriquecer a reprodução dos rolos de pianola.

Praticamente todos os pianistas de nome à época gravaram “piano rolls” (como se chamavam tais bobinas);    assim existem ótimos rolos de Eubie Black, Jelly Roll Morton, Fats Waller, James P. Johnson, Clarence Williams, Lucky Roberts, Charles Davenport, dentre outros.

Através de edições masterizadas em LP pode-se ainda ter acesso a este fantástico acervo, notadamente os da Biograph Records em sua “piano roll series” editada nos anos 70.

Algumas das famosas companhias de “piano rolls” foram a QRS Music Rolls, Vocalstyle Song Roll, Wurlitzer, Mel-O-Dee, Duo Art e  e Imperial Roll Co.

Com a pianola muitas canções blues, ragtimes e stomps foram apreciadas em refinados salões, difundindo assim, não só os fundamentos da música negra, como o próprio piano Jazz.

As gravações em disco foram editadas no que se apelidou de “bolachas pretas”, inicialmente de 10 polegadas a 78 rotações por minuto, cuja característica intrínseca eram os fatídicos 3 minutos e meio de duração máxima de cada lado.   Fatídicos porque os músicos e arranjadores tinham que se desdobrar para conseguir se expressar naquele tempo exíguo e, pior ainda, para os de Jazz que necessitando de inteira liberdade de criação, ficavam bem limitados, mesmo assim, maravilhas foram perpetuadas.

A companhia Blue Note Records usou por vezes os discos com 12 polegadas, ampliando o tempo para cerca de 6 minutos.   Muitas gravações foram feitas usando os dois lados de um disco, tais como Empty Bed Blues (1928) de Bessie Smith, Anvil Chorus I e II (1940) de Glenn Miller, Reminiscin’ In Tempo I, II, III e IV (1935) de Ellington (em 4 faces!!!)  e muitas outras...  Mas a quebra da emoção no processo de interrupção para a troca de lado por vezes era fatal.

Outro fato que tolheu bastante o músico foi o processo de gravação, que até 1925 era inteiramente acústico, não havia amplificação elétrica e naturalmente nem microfones e a captação do som se fazia através de uma enorme corneta cônica, com o registro ocorrendo por meio de uma agulha acoplada a um diafragma, na extremidade do funil da corneta.  As ondas sonoras captadas pela tal corneta faziam vibrar o diafragma, que por sua vez vibrava a agulha metálica, que riscava um disco de cera girando na velocidade de 78 rpm. Depois esse disco era recoberto com laca para endurecer e depois fundida uma matriz de metal, para posterior prensagem a quente das “bolachas” fabricadas com goma laca na cor preta.

Percebe-se logo que existiam enormes problemas de captação dos instrumentos, já que os sons emitidos possuindo vasta gama de frequências, ficavam limitados pelo processo a uma faixa de apenas 250 a 2.500Hz (atualmente a faixa é de 20 a 20.000Hz). Lidava-se ainda com diferentes intensidades e, muito importante, com o volume sonoro relacionado à quantidade de massa de ar deslocada pelo instrumento, uma vez que o fluxo de ar é que iria mover a agulha.  Assim, por exemplo:  o contrabaixo de cordas tem alguma intensidade e volume de ar muito pequeno; a tuba possui intensidade pequena e grande volume;  o clarinete de som agudo de grande intensidade mas pouca massa sonora e de características semelhantes ao cornetim;   já o trombone talvez fosse o de melhor compromisso entre intensidade e massa de ar.   O piano era de difícil captação pela forma como emite o som e, se prestarmos atenção às gravações, verificamos que se limitam a apenas 2 oitavas, já que as frequências mais altas e mais baixas não eram captadas (só para lembrar, o piano possui 07 oitavas).  A bateria era grandemente sacrificada e alguns usavam os pratos, apesar do som ser reproduzido muito seco devido à limitação das frequências altas;  empregava-se bastante o woodblock (bloco de madeira) de boa reprodução e o bumbo, por vezes, parecia um tiro de canhão e fazia saltar a agulha assim dificilmente era usado.

Babby Dodds, um dos bateristas pioneiros, somente após a gravação elétrica teve reconhecido seu potencial com o instrumento.

Uma sessão de gravação era bastante complicada e geralmente eram feitos vários testes com a banda, marcando-se no chão a posição dos músicos de acordo com seus instrumentos, do arranjo e dos solos.    Assim eram distribuídos em relação à distância da corneta e se tal ordem não fosse estabelecida o som poderia embaralhar, algum instrumento sumir ou ainda e devido a um maior volume de som, a agulha saltar na cera estragando tudo.

Finalmente a tecnologia deu um enorme salto com a gravação por processo elétrico, criado pelos inventores Henry C. Harrison e Joseph P. Maxfield da Western Electric, ampliando-se a faixa de frequências para 50 a 6.000Hz.

O primeiro disco gravado por este processo e editado comercialmente foi lançado em fevereiro de 1925 pela Columbia, com a canção You May Be Lonesome (Col-328-D), sendo Art Gillham (*1895 †1961) o cantor e pianista que atuava nos teatros de vaudeville, sendo conhecido como “The Whispering Pianist” (O Pianista Sussurrante), e antes de gravar para a Columbia possuía uma pequena banda de Jazz,  a “Art Gillham's Southland Syncopators”. Gillham convidado para testar o uso do microfone recebeu um "bonus" de US$1,000 da Columbia.  

Não obstante, em janeiro do mesmo ano houve o lançamento pela Gennett (#5592) da cantora de blues Kitty Irvin em uma versão de COPENHAGEN (Charles Davis / Frank Melrose), que talvez tenha sido gravada também pelo novo processo, talvez, porque várias companhias fonográficas pagaram a patente e iniciaram as gravações elétricas, tornando-se confuso distinguir nos lançamentos comerciais quais eram editados no novo processo - uns escreviam no selo outros não.

Havia um certo receio quanto à divulgação da nova tecnologia, já que o fonógrafo elétrico, também uma novidade, só se popularizaria em 1926, a maioria dos discos gravados eletricamente ainda era reproduzida em gramofones acústicos e, como a diferença entre as reproduções era quase imperceptível sem demonstrar sensível melhoria, o crédito para o novo processo poderia ficar prejudicado e, consequentemente, as vendas.

2 comentários:

BetoRocco disse...

Muito interessante, detalhes da história do 78 rpm. que pensava ter só uma fase.

Anônimo disse...

Major artigo fantástico tudo sobre sistema de gravação e parece que vem mais até chegar no laser !! estou no aguardo
Carlos Lima