Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho); David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels), Pedro Cardoso (o Apóstolo), Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge) e Geraldo Guimarães (Gerry).

26 maio 2021

 

Série: Histórias do Jazz

  DO OUTRO LADO DO  JAZZ # 3

 LINGUAGEM  E  GRAMÁTICA

 A esta simples palavra Jazz deve-se incorporar seu real significado musical e afinal, do que se trata? O que é Jazz?

Acontece que há uma verdadeira lenda toda vez que historiadores, críticos e até mesmo músicos se põem a escrever algo que comece por tentar definir ou explicar o que seja Jazz, com uma série de divagações, até filosóficas...

Existe uma célebre citação provável e atribuída ao pianista Fats Waller;  ao ser  interpelado, talvez por uma senhora já idosa sobre o que seria realmente Jazz, Fats teria dito: ― “Ora, se a senhora até hoje não sabe será muito difícil que vá compreender agora!”.

Se tal episódio possuir o mais leve fundo de verdade, entende-se que Fats quis dizer ser o Jazz uma arte que sensibiliza, que emociona independente de qualquer significado ou explicação didática ou filosófica.

É possível que essa seja a melhor definição, nada acadêmica mas sentimental.

Mesmo sem uma definição formal pode-se avaliar e sentir que o Jazz prima por uma linguagem particular, uma gramática própria que apesar de estar sempre em evolução ou apenas em mutação, não permite aceitar como Jazz qualquer interpretação, mesmo que apresente alguma forma de improvisação ou levada apenas em um ritmo “suingado”.

Assim, encontra-se de tudo quanto se possa imaginar titulado como sendo Jazz e talvez os maiores culpados sejam os próprios produtores, principalmente dos festivais, que impõem uma série de apresentações, que nada têm de Jazz, apenas com a justificativa de que há improvisação visando exclusivamente o apelo comercial.

Ah... improvisou? bem, então é Jazz e mesmo assim, são bastante questionáveis as ditas improvisações, porque baseado neste conceito, já nos foram impostas em vários supostos eventos jazzísticos inclusive no Free Jazz Festival, coisas do tipo: violoncelo imitando cuíca, depois com ajuda de bateria de escola de samba, grupo de lambada e axé, sanfoneiro, conjunto de chorinho (que, aliás, insistem em dizer que é o “Jazz brasileiro”), enfim manifestações boas ou ruins, mas que devem ser postas cada uma em seu devido lugar, contudo não se pode abobinar totalmente tal festival porque muitos magníficos jazzístas foram apresentados.

De qualquer forma, não fugindo ao academicismo, o certo é que Jazz designa um gênero de música criado pelos afro-americanos dos EUA, a partir do início do século XX, tendo como raízes as tradições musicais do africano ocidental, seguindo-se um processo de aculturação afro-euro-americana que durou todo o período da escravatura (cerca de 200 anos) e no qual importantes transformações ocorreram na música negra religiosa e profana.   Tais modificações incluem fusões com a cultura musical de origem européia surgindo, então, três segmentos cujas principais características antecederam o Jazz, a saber:   o spiritual,  o blues  e  o  ragtime.

Estes elementos amalgamados convergiram para uma forma ou maneira de expressão e criação musical a que se denominou de Jazz.

Sua linguagem artística, assim, se traduz por um intenso espírito negróide, personificado pela gramática que inclui, beat, drive, suingue, feeling, sonoridade, ataque, enfim elementos que vêm caracterizar o vigor, a garra e a força impulsiva na maneira de tocar, notadamente sua intensidade rítmica, porém referindo-se sempre ao emprego do emocional em uma interpretação.

Aliada a isto tudo vem a improvisação, característica fundamental da música de Jazz sendo comumente mal interpretada pelo público leigo e, até mesmo por aficionados, no sentido de que todo solo seja uma execução improvisada.

Improvisar na música não é uma invenção momentânea, repentista, seu sentido é muito mais amplo e vem significar a liberdade de criação do músico solista quando usa seu talento para se expressar livremente, melódica e harmonicamente, sobre uma base pré-definida em uma composição dele próprio ou não.

Improvisa choruses (⁕) dentro de sua concepção expontânea e que podem até ser criados no momento, mas de uma forma geral são organizados, trabalhados "a priori".

Por vezes apenas algumas ornamentações e clichés são introduzidos.

Naturalmente, este talento para desenvolver um solo improvisado com maior criatividade musical é que denota um grande músico de Jazz.

Modernamente é costume se titular de Jazz qualquer coisa, principalmente para se auferir de um certo "status" que o gênero musical confere, enfim é um "must" intelectual gostar de Jazz, tocar Jazz, frequentar locais em que se executa Jazz (mesmo sem ouví-lo) ou ainda formas de pseudo Jazz.

Também há de se notar que outros gêneros musicais que possuem algum tipo de liberdade ou mesmo de improvisação não são obrigatoriamente Jazz, ou mesmo nada têm a haver como é o caso do nosso chorinho.

E a Bossa Nova?   Bem... foi sem dúvida a maior contribuição estrangeira (no caso, brasileira) à linguagem do Jazz.

Praticamente todos os grandes músicos do Jazz tocaram em algum momento Bossa Nova com diferentes níveis de interpretação.

Alguns incorporaram definitivamente o estilo ao seu repertório, outros flertaram por algum tempo e a levada brasileira, sincopada e sutil deixou marcas indeléveis na história do Jazz num interessante efeito "boomerang" já que, na verdade, fechava-se um circuito em que o samba original, alimentado por harmonias e instrumentação jazzísticas, gera ou influi grandemente na Bossa Nova, que por sua vez passa a influenciar fortemente o Jazz dos anos 60 até hoje.

(⁕) – choruses – (pronúncia kóresses) - plural de chorus - termo latino mas oriundo do grego khoros que significa o coro ou refrão, ou seja o verso musical de uma composição ou ainda o estribilho. Tocar um CHORUS é tocar o verso de um tema. Improvisar um CHORUS é criar um verso musical diferente do original mantendo, contudo, a mesma base harmônica e o mesmo número de compassos daquele verso original. É muito usado em Jazz dizer-se que tal músico improvisou um certo número de choruses de um tema quase como uma medida da capacidade de improviso, de criatividade desse músico. Uma das mais famosas apresentações refere-se aos 27 choruses (6min:22seg!) improvisados pelo saxofonista tenor Paul Gonçalves na orquestra de Duke Ellington ao atuar no Newport Festival de 1956 no tema - Diminuendo and Crescendo In Blue, praticamente salvando a apresentação da banda que estava, até aquele momento, meio morna sem muito entusiasmo por parte do público. Entretanto, de repente uma moça loura levanta e se põe a dançar freneticamente, Paul Gonçalves percebeu e vai então incrementando seus choruses iniciando uma grande empatia entre o saxofonista e a "dançarina" e que pouco a pouco vai contaminando todo o público contando ainda com a ajuda de magnífico swing sustentado pela seção rítmica notadamente pelo baterista Sam Woodyard, levando a uma excessiva emotividade coletiva, a ponto de Ellington começar a se preocupar e a gritar para Paul terminar aquilo porque já estava indo longe demais, ou seja a coisa estava muito “hot” e poderia incendiar. Ao terminar o solo de Paul a banda ataca e o público já beirando a histeria aplaude delirantemente.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

Perfeito Major, excelente artigo. O que virá ainda por aqui? aguardo
Carlos Lima