Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho); David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels), Pedro Cardoso (o Apóstolo), Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge) e Geraldo Guimarães (Gerry).

11 janeiro 2017



Piano – Uma História de 300 anos, edição do SESC, com apresentação e texto de João Marcos Coelho, DVD com duração de 68 minutos e livro com 78 páginas, é trabalho sério e de qualidade abordando obras de J.S.Bach, Scarlatti, Mozart, Beethoven, Chopin, Brahms e outros.     Recomendamos mais esta realização do SESC, sempre lançando material de qualidade.

Havíamos interrompido a edição da série “PIANISTAS DE JAZZ” na “20ª Parte” com o pianista número “24” (Bill Evans, 24.b Acima de Qualquer Nivel) em 17/outubro/2015 e agora prosseguimos com o pianista número “25”, Errol Garner, que será postado em 03 partes, dada a extensão do texto.
                                                          Série   “PIANISTAS  DE  JAZZ
Algumas Poucas Linhas Sobre o Piano e os Pianistas
21ª Parte
(25)(a) ERROLL GARNER         Excelência sem estudo
Boa parte do texto seguinte foi feito para trabalho conjunto com nosso falecido amigo e Mestre LUIZ CARLOS ANTUNES, o “Lula”, quando pensávamos em escrever livro dedicado e esse gigante do teclado, ERROLL GARNER.

Escrevia “Lula” que a admiração dele por GARNER ocorreu no início da década de cinqüenta do século passado, quando o rádio ainda cumpria seu primordial papel de difusor cultural. Certa tarde “Lula” foi atraído para perto do rádio por uma música executada por um pianista de forma totalmente diferente do que habitualmente se ouvia; colou os ouvidos no aparelho, aguardando o anúncio do locutor e foi premiado: - Ouvimos “Penthouse Serenade” com o pianista Erroll Garner. 
Naquela época o comércio fonográfico ainda era incipiente, principalmente no que se referia a LP’s, então escassos. Após infrutíferas buscas, foi orientado por amigos a procurar as “Lojas Murray” (centro da cidade do Rio de Janeiro), onde Jonas Silva, mais tarde proprietário do selo “Imagem”, importava discos sob encomenda. Por sorte, lá estava o 10” da “Savoy” com o “Penthouse Serenade”.
Daí para a frente, procurou adquirir tudo o que ERROLL GARNER gravou, principalmente os LP’s lançados no Brasil.
Coletou o máximo possível de informações, organizando arquivo próprio com entrevistas, reportagens, “releases” e noticiário referente á estadia de ERROLL GARNER no Rio de Janeiro, quando se apresentou no Teatro Municipal em magnífica récita, ocorrida em 10 de julho de 1970 (viajou para São Paulo no dia seguinte, onde realizou 03 apresentações de 12 a 15 de julho, retornou ao Rio de Janeiro no dia 16 de julho, de passagem para temporada na Europa).
Entusiasmado com a idéia de “Lula” e tendo ouvido, admirado e desfrutado da arte pianística de ERROLL GARNER desde os anos 50 do século passado, dediquei tempo para pesquisar a vida desse músico excepcional. 
Na verdade e na sua aparente (nunca real) limitação de “aproach”, GARNER possuía amplo senso de organização sonora, o que lhe permitia desempenho pianístico com sonoridade de grande orquestra, a par de ter sido um dos grandes improvisadores do JAZZ.
Os que tiveram a ventura de acompanhá-lo quase nunca sabiam o que seria executado. Seu repertório, constantemente renovado, era vastíssimo e mesmo quando retornava a um tema, modificava o tempo, ou a harmonia, ou a tonalidade, conferindo execução inteiramente diferente da(s) anterior(es). Um dos clássicos exemplos disso são as 04(quatro) versões que deixou registradas de “St. Louis Blues”.
Uma escuta atenta e uma análise aprofundada do extenso patrimônio discográfico que GARNER nos legou, nos faz descobrir, sob a superfície luxuriante carregada de tons rapsódicos, de arpégios e aparência barroca, um admirável domínio da vizinhança de todos os estilos pianísticos: é um pequeno universo do “piano-Jazz”.
Do “stride-piano” de James P. Johnson e “Fats” Waller(escute-se a versão de GARNER em setembro de 1945, do clássico “I Know That You Know”), ao “boogie-woogie”(“Boogie Woogie Boogie” de dezembro de 1944) e ao largo emprego dos “block-chords”(1953, “I’ve Got My Love To Keep Me Warm”), GARNER está sempre a vontade.
Mesmo não sendo um devoto do “Blues” dos quais poucos registrou, ainda assim e como demonstrou na gravação de “Way Back Blues” em 1956, possuía um “feeling” exato.
De resto suas mãos se multiplicam: ataque poderoso com as duas, impressionante rapidez e destreza com a direita(ouvir sua versão de “Honeysuckle Rose” de janeiro de 1951), inconfundível e característica defasagem(ligeiro atraso) da direita em relação à esquerda(“Undecided” de março de 1949 é um primeiro de múltiplos exemplos) e completa independência entre as duas – o que lhe permitia combinar ritmos diferentes com absoluta naturalidade(ouça-se o registro de 1956 para “But Not For Me”). Permanente carga de “swing”, alimentando incessantemente sua improvisação com inesgotável fantasia criativa, desenvolvendo ao infinito qualquer melodia, mesmo se banal, enriquecendo-a com adornos, tessituras rapsódicas, variações de timbre, até literalmente transfigurá-la.
Como episódio esclarecedor das execuções de GARNER, lembramos a exclamação de Jerome Kern após escutar as peças de sua autoria, “Who” e “Yesterdays”, gravadas por GARNER em março de 1955(texto da capa do LP “Erroll”, EmArcy MG 36.069):
“..........será possível que tudo isso seja obra minha ? ? ? .............”.
É importante lembrar as magníficas “introduções” de GARNER, sempre inovadoras e imprevisíveis mesmo para ouvintes preparados, provocando a curiosidade e criando suspense até que, quando ele atacava o tema com seu inconfundível “Garner beat”, o auditório não podia fazer menos que explodir em ovação, descarregando a tensão acumulada e deixando-se envolver pela impressionante cascata de notas.
Simples é ouvir e deliciar-se com a música de ERROLL GARNER, mas complexo é analisá-la. Transcrevemos a seguir em tradução livre e adaptada, uma pequena parte do artigo de Mini Clar(revista “The Jazz Review” de janeiro de 1959, páginas 06 a 10), gentilmente cedido pelo “cjubiano”Carlos Augusto Tibau Ribeiro.
“........Analisar a música de ERROLL GARNER envolve o exame, não de um, mas de vários estilos de tocar. Talvez mais que qualquer outro pianista de JAZZ, ele sempre prosseguiu desenvolvendo seu estilo. De um início razoavelmente simples, GARNER forjou continuamente a produção de uma crescente complexidade de idéias e de sons. Sem importar o quanto seu desenvolvimento foi radical, ele sempre manteve identidade musical marcante em todo o seu trabalho. 
Três influências(ou raízes) são identificáveis no estilo de GARNER, a saber: (1) o Ragtime, (2) o Impressionismo e (3) o “Stride-piano” do Harlem à “Fats” Waller. As harmonias luxuriantes e as sinuosidades sonhadoras, nas baladas em tempo lento de GARNER, vêm do Impressionismo; o balanço e a jovialidade nas faixas em “up-tempo” derivam do Ragtime; a vitalidade robusta e o humor insinuante que permeiam seu toque, vem de “Fats” Waller e da sua escola “Stride”. Observe-se que essas raízes são puramente pianísticas, sem influência de estilos conseqüentes dos instrumentos de sopro. Uma aproximação bem satisfatória pra o estudo do estilo de Garner pode ser obtida considerando: melodia / harmonia / ritmo / cores tonais / expressão emocional. Melodicamente GARNER utiliza cada recurso possível em sua improvisação: as duas mãos executam papéis melódicos(padrões para a mão esquerda, trabalho de mãos cruzadas e freqüente alternância de fragmentos melódicos). Em execuções com um único dedo GARNER emprega notas de enfeite, apogiaturas simples e duplas, arpégios ascendentes e descendentes, escalas cromáticas e diatônicas, escalas pentatônicas e repetição de notas. A repetição constante de notas da melodia é uma marca registrada de GARNER: notas ou acordes são repetidos duas ou três vezes por tempo.....”
Erroll Louis Garner, artisticamente ERROLL GARNER, nasceu em 15 de junho de 1921 na cidade de Pittsburgh, na Pensilvânia., a mesma cidade natal de tantos e tantos outros nomes importantes no JAZZ e nos espetáculos, que citaremos mais adiante.
A família era musical: o pai era tenor na Igreja e um diletante do piano e de outros instrumentos(guitarra e bandolim em um conjunto amador), que tocava de ouvido; seu irmão mais velho, Linton, tocava trumpete, piano e fazia arranjos, tendo chegado a colaborar com Billy Eckstine e Dizzy Gillespie; as irmãs mais jovens, Martha e Ruth, estudaram piano. Em contrapartida GARNER teve um irmão gêmeo, Ernest, que para desespero da família nasceu retardado e viveu muito tempo em um instituto de reabilitação psico-física.
Nesse ambiente a educação musical do menino GARNER estava garantida e ele logo demonstrou possuir audição e memória musicais extraordinárias: o irmão Linton, em seguidas ocasiões, observou com indisfarçável inveja que o menino, mesmo sem conhecimento musical, era capaz de tocar qualquer música após ouvi-la uma única vez.
Sua irmã Ruth declarou a James M. Doran, biógrafo de GARNER, que quando este estava tomando lições de música, ao invés de aprender a ler as partituras memorizava os exercícios tal como a professora os executava no teclado: depois os tocava sem respeitar as notas do pentagrama, mas à sua maneira, com digitação “heterodoxa” e interpretação toda pessoal. Segundo a família GARNER com nada mais que 03 anos de idade já executava com as 02 mãos trechos de Art Tatum, Teddy Wilson, Earl Hines e “Fats” Waller: ouvia os discos e os reproduzia de ouvido.
Claro que depois de cansativas e infrutíferas tentativas de ensinar a maneira “correta” ao menino GARNER, a professora recusou-se a prosseguir ensinando-o, até porque o interesse maior do seu aluno era o beisebal.
Deixado à sua sorte GARNER saiu-se muito bem, se confirmada a versão de que já aos 10(dez) anos participava de uma orquestra de jovens, a “Kan-D-Kids”, que se apresentava regularmente na rádio local(emissora KDKA).
Aos 11(onze) anos o menino GARNER tocou nos “riverboats” do Rio Allegheny.
Na escola e entre outros que o encorajaram a “ir para a estrada”, destacaram-se seu amigo Dodo Marmarosa e o então bem jovem Billy Strayhorn(ambos já então com sólida formação musical), assim como Fritz Jones(leia-se Ahmad Jamal), que foi um de seus principais seguidores musicais. 
Tantos músicos como contemporâneos ? ? ? Claro que sim; Pittsburgh foi importante celeiro de figuras do JAZZ ou ligadas ao mundo dos espetáculos, bastando citar-se, por exemplos e entre outros, os seguintes nativos:
Ahmad Jamal - Art Blakey - Babe Russin - Barry Galbraith - Billy Eckstine - Billy May - Billy Strayhorn - Bob Cooper - Christina Aguilera - Dodo(Michael) Marmarosa - Dakota Staton - Eddie Safranski - George Benson - Henry Mancini - Horace Parlan - Kenny Clarke - Lena Horne - Mary lou Williams - Oscar Levant - Paul Chambers - Perry Como - Ray Brown - Roy Eldridge - Shirley Jones - Stanley Turrentine - Stephen Foster - Tommy Turrentine - Victor Herbert....ufa!!
GARNER não se exercitava muito e era do tipo que gostava de viver muitíssimo bem, mesmo sem possuir um piano à sua disposição. A quem lhe perguntava qual era o segredo de uma técnica, respondia:
“....basta sentar-me ante o piano e pedir às mãos que façam seu trabalho....”
Sempre será lembrada sua declaração(revista “Melody Maker”, dezembro de 1952) de que:
“....se posso soar melhor sem ler música, porque deve mudar meu estilo???... para mim é suficiente escutar, sentir a música - deixo a leitura para os outros....”
A carreira precoce a partir de então estava delineada e prosseguiria sem obstáculos. 

Prosseguiremos nos próximos dias

8 comentários:

MARIO JORGE JACQUES disse...

FIAT LUX!!! finalmente o retorno do Apóstolo, Pedro Cardoso, ao nosso blog com magníficas postagens. Espero que permaneça e não "fuja" mais!

(sei que foi um problema técnico e não conseguia entrar como autor no blog, mas conseguimos resolver)
Abração

Nelson disse...

Belo trabalho Mestre "Apóstolo" Pedro.

E pensar que Art Blakey tornou-se baterista pór causa de Errol Garner. Tocava ele piano, em um café em Pttisburgh, quando Garner pediu para dar "uma canja" no intervalo. Blakey nunca mais sentou no banco do piano. Eram grandes amigos e, Blakey tornou-se um "ás" das baquetas.

"nels"

pedrocardoso@grupolet.com disse...

Estimado NELSON:
O episódio fará parte da postagem - perdemos um péssimo pianista (BLAKEY) e ganhamos um belo "batera".
Abraços,
PEDRO CARDOSO

Carlos Tibau disse...

Amigo Pedro
Obrigado pelo excelente post sobre o Garner e de algumas recordações do querido e saudoso amigo Lula.
Forte abraço.

pedrocardoso@grupolet.com disse...

Prezado TIBAU:

Lula fez a crítica dos lançamentos no Brasil, enquanto fiquei com a parte histórica - Rio / São Paulo funcionando 25 horas/dia e muita, muita troca de informação e de pesquisas.
Saudades de nosso querido LULA, presente em espírito quando "O Assunto É Jazz", claro.
Você ainda será citado quando chegue aos 10" de tão saudosa memória e estima.
Abraços,

PEDRO CARDOSO

Bob Bruza disse...

Que belo texto com riqueza de informação, Pedro Cardoso. Parabéns!

Carlos Tibau disse...

Amigo Pedro
Muito obrigado pela atenção e creio que nosso saudoso amigo Lula vai, por mim, ser sempre lembrado não só pela sua importância no cenário do Jazz nacional como meu primeiro "professor" de Jazz.
Forte abraço

Anônimo disse...

Òtimo retorno, grandes postagens parabéns
Carlos Lima