Tentando recuperar o tempo perdido, solto para aqueles que não as leram no site do Jornal do Brasil, duas colunas consecutivas do nosso querido colaborador "remoto". Assim:
Azar Lawrence merece, enfim, lançamento à sua altura
por Luiz Orlando Carneiro - 06/09/14
O saxofone tenor – instrumento em forma de “j” inventado por
Adolphe Saxe em 1845, e reinventado quase um século depois por Coleman Hawkins
e Lester Young – tornou-se, com o tempo, uma espécie de “logo” do jazz. E
talvez seja por isso que é tão grande o número de excelentes saxofonistas que
nunca foram elevados ao estrelato. Aqueles que os críticos e jazzófilos mais
atentos qualificam de underrated,under the radar, unsung heroes ou “músicos
para músicos”, dentre os quais estilistas influentes como Don Byas (1912-72),
Charlie Rouse (1924-88), Booker Ervin (1930-70) e Hank Mobley (1930-86).
Há uma legião de veteranos saxofonistas tenores atuando nos
Estados Unidos, em clubes e festivais, como líderes ou sidemen, praticamente
desconhecidos, mesmo pelos leitores dos principais sites ou revistas de jazz.
É o caso de Azar Lawrence, 61 anos, que só agora mereceu o
lançamento de um CD à altura de sua arte, como líder, instrumentista e compositor,
numa etiqueta especializada de primeira linha: The seeker (Sunnyside). O último
álbum de sua autoria, à frente de um quarteto,Prayer for my ancestors, tinha
sido editado, em 2008, pelo selo indie Furthermore.
O item mais conhecido da modesta discografia de Lawrence é
Enlightenment (Milestone), gravado no Festival de Montreux (Suíça), em 1973.
Com apenas 20 anos de idade, ele integrava então o quarteto do grande McCoy
Tyner, que ficou célebre, na década de 1960, como “o” pianista de John Coltrane.
Azar Lawrence também aparece como sideman de Miles Davis, na
fase final fusionista (jazz-rock) do lendário trompetista, no obscuro Dark
Magus, registro de um show no Carnegie Hall, em 1974, e que só foi reeditado em
CD pela CBS, nos Estados Unidos, em 1997.
No novo álbum The seeker, já à venda nas lojas virtuais, o
saxofonista tenor - herdeiro estilístico do John Coltrane de A love supreme
(1964) eImpressions (1963) – é ouvido, ao vivo, no clube Jazz Standard (Nova
York), numa noite de dezembro de 2011. Seus parceiros são músicos de grande
prestígio na cena jazzística: o mestre da bateria Jeff “Tain” Watts; o pianista
venezuelano Benito Gonzalez, que conquistou Nova York depois de vencer, em 2005, a Great American Jazz
Piano Competition; o baixista Essiet Okon Essiet; o eminente trompetista
Nicholas Payton.
Seis das sete peças de The seeker foram escritas por
Lawrence, destacando-se as duas primeiras, de modalidade oriental, intensamente
coltraneanas, com muita emoção, sopro vigoroso e as indispensáveis sheets of
sound: Gandhi (10m25) e Lost tribes of Lemuria (7m40).
A faixa-título do CD, de 12 minutos, é desenvolvida pelo
líder, no sax soprano, a partir de oito notas, com aquele mesmo toque hipnótico
(healing music) do Coltrane de My favorite things. De volta ao tenor, Azar
Lawrence sublinha o seu lado zen nas baladas Rain ballad (5m55) eSpirit night
(10m). A última faixa do set ao vivo no Jazz Standard é a vibrante Venus rising
(7m10), com realce para um brilhante solo do trompetista Payton.
O pianista Benito Gonzalez está para McCoy Tyner como
Lawrence está para Coltrane. Dono de uma técnica prodigiosa, o venezuelano de
38 anos “ataca o piano com a força e a determinação de um pit bull”, para usar
uma frase de Len Lyons tirada do capítulo referente a Tyner do seu livro The
great jazz pianists (Quill, N.Y, 1983). No CD The seeker, Gonzalez é um show à
parte, e ainda assina a irresistível composiçãoOne more time (9m20), a única do
álbum que não é de Azar Lawrence.
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Mauro Senise realiza "sonhos antigos" em 'Danças'
por Luiz Orlando Carneiro - em 13/09/14
O saxofonista e flautista Mauro Senise, carioca de 64 anos,
é uma das maiores expressões da música instrumental brasileira, desde a década
de 1980, quando fundou, com o baterista Pascoal Meirelles, o conjunto Cama de
Gato. Além disso, nos saxes alto e soprano, é umjazzman “bilingue” do primeiro
escalão. Ou seja, é tão fluente no chamado samba jazz como na linguagem do
bebop. Se tivesse resolvido emigrar para os Estados Unidos, teria hoje, em Nova York, o mesmo
prestígio conquistado pelos emigrés Duduka da Fonseca, Claudio Roditi, Hélio
Alves, Romero Lubambo e Nilson Matta. Aliás, o guitarrista Lubambo e o baixista
Matta foram seus comparsas em formações diversas do Cama de Gato.
Dois anos depois de Afetivo – álbum comemorativo dos 40 anos
de carreira de Senise - o selo Biscoito Fino está lançando, oficialmente, o
CD/DVD Danças, na próxima quarta-feira, dia 17, às 21h, no Espaço Tom Jobim, lá
no Jardim Botânico.
A ideia da nova produção é assim explicada nas notas do
livreto escritas pelo próprio músico:
“O projeto Danças é a
cristalização de alguns sonhos antigos. O primeiro deles era o de reunir num só
CD alguns dos meus compositores/arranjadores preferidos. Consegui! Gilson
Peranzetta, Cristóvão Bastos, Jota Moraes e Antonio Adolfo estão aqui comigo. O
segundo era o de transmitir de alguma forma o meu interesse pela dança,
ensejada pela boa música. O terceiro era o de juntar minha amiga Deborah Colker
com outro amigo, Walter Carvalho, de preferência tendo a minha música como
pretexto”.
Na apresentação do CD/DVD, o jornalista, saxofonista
bissexto e renomado crítico musical Roberto Muggiati – que acompanhou de perto
toda a carreira de Senise – registra que o título e o conceito de Danças o
“despertou bruscamente para um aspecto da música de Mauro Senise que sempre
esteve ali: o seu espírito dançante”. E acrescenta: “O próprio projeto desse
seu vigésimo trabalho autoral assume o aspecto de um grande baile de almas e/ou
auras irmãs, em que ele convida para dançar, sucessivamente, parceiros de toda
uma vida”.
Das 12 faixas do CD, os ouvintes antenados na temática
brasileira com o tempero harmônico e o “som da surpresa” típicos do jazz vão
preferir, certamente, as seguintes: Vou deitar e rolar (Baden Powell), em
quarteto, com Senise (sax alto), Peranzetta (piano e arranjo), Zeca Assunção (baixo)
e Ricardo Costa (bateria); Chorosa blues (Antonio Adolfo), em quinteto, com o
líder novamente no sax alto, Adolfo (piano e arranjo), Leonardo Amuedo
(guitarra), Rodrigo Villa (baixo) e Costa; Casa de Marimbondo (Peranzetta), com
o autor, arranjador e pianista em duo com Senise (sax alto); Sem palavras
(Cristóvão Bastos), com o líder no sax soprano mais Bastos (arranjo e piano),
Gabriel Geszti (acordeão), Villa e Costa; Garoto de POA (Jota Moraes),
envolvente valsinha interpretada em duo por Moraes (vibrafone) e Senise (sax
soprano).
Mas há música, da boa, para todos os gostos nas demais
faixas, inclusive momentos assumidamente sentimentais, com a Orquestra dos
Sonhos (oito violinos, três violas e dois violoncelos) atuando como “colchão”
para o sax alto (ou a flauta) de Senise em arranjos de Miles (Sueli
Costa/Peranzetta), Ilusão à toa (Johnny Alf/Jota Moraes) e Noite de verão (Edu
Lobo-Chico Buarque/ Cristóvão Bastos).
JAKOB BRO
O guitarrista dinamarquês Jakob Bro, 38 anos, cultor de um
jazz camerístico que não dispensa refinados efeitos eletrônicos, apresenta-se
no Rio, à frente do seu trio, nos próximos dias 18 (Festival Multiplicidade, no
Oi Futuro, Flamengo, 19h) e 19 (Santo Scenarium, Jardim Botânico, 21h). Os
jazzmen também dinamarqueses Anders “AC” Christensen (baixo) e Jakob Hoyer
(bateria) completam o trio.
Jakob Bro ganhou justa fama nos Estados Unidos e na Europa
como integrante de dois primorosos conjuntos: a Paul Motian Band, um septeto
com três guitarras, dois saxes, baixo e a bateria do saudoso Motian (Garden of
Eden, ECM, 2004); o quinteto do trompetista polonês Tomasz Stanko (Dark eyes,
ECM, 2009). No ano passado, o guitarrista lançou o CD December song (Loveland),
como líder, na companhia luxuosa de Bill Frisell (guitarra), Lee Konitz (sax
alto), Craig Taborn (piano) e Thomas Morgan (baixo).
2 comentários:
Este cd do Azar Lawrence é muito bom mesmo! Vale conferir.
Viva MAURO SENISE, um senhor músico que agora nos brinda com mais "a masterpiece".
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