Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho); David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels), Pedro Cardoso (o Apóstolo), Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge) e Geraldo Guimarães (Gerry).

01 agosto 2011

ALGUMAS POUCAS LINHAS SOBRE A
GUITARRA E OS GUITARRISTAS - 11



Talmadge Holt Farlow, artisticamente TAL FARLOW, nasceu em Greensboro / Carolina do Norte no dia 07 de junho de 1921, vindo a falecer aos 77 anos, em New York e no dia 27 de julho de 1998.
Seu pai tocava guitarra, uquelelê, violino e clarinete; foi tomando emprestada a guitarra de seu pai que TAL FARLOW iniciou seu aprendizado amador com 08 anos de idade, como diversão e de forma totalmente empírica e muito ao estilo dos guitarristas da Carolina do Norte; de JAZZ nada ouvira musicalmente até então.
Até os 19 anos trabalhou como desenhista e cartazista. Foi com essa idade e numa loja de aparelhos de rádio vizinha àquela em que trabalhava, que escutou uma gravação de Charlie Christian: passou a ser freqüentador da loja vizinha desde então, para ouvir JAZZ, uma vez que não possuia toca-discos.
Ficou fortemente impressionado com a música de Charlie Christian, não apenas pela técnica mas, sobretudo, pelo som da guitarra elétrica que lhe abria possibilidades até então desconhecidas.
Os temas mais antigos da banda de Benny Goodman deixaram-no fascinado e passou a copiar os solos de Charlie Christian nota por nota, até apreender sua concepção, sentido e digitação.
Pela mesma época e por meio do rádio ouviu muito a orquestra de Count Basie e os solos de Lester Young, o “Pres”, cujas improvisações mantinham estreita relação com as de Christian (ou, talvez mais corretamente, os solos e as improvisações de Christian mantinham estreita relação com os de Lester Young), ao mesmo tempo em que podiam ser reproduzidas à guitarra.
TAL FARLOW dedicou-se a pintar cartazes para espetáculos e festas de negros (brancos sómente podiam participar como espectadores), o que lhe possibilitou conhecer e ouvir ao vivo Lionel Hampton, Irving Ashby, Count Basie, Andy Kirk e os irmãos gêmeos Trenier. A partir daí seu máximo interesse passou a ser a música de JAZZ, dedicando-se com seriedade ao aprendizado, ainda que de forma auto-didata.
Foi instalada em sua cidade grande contingente da aviação americana, em função da IIª Guerra Mundial, que necessitava de músicos para suas festas e bailes: “sopa no mel” para TAL FARLOW que conseguiu participar e conhecer outros músicos, entre os quais o pianista Jimmy Lyons, que o impressionou fortemente pelo sentido harmônico; esse um marco decisivo em sua formação, ainda que permanecesse um “intuitivo”, sem educação acadêmica, sem leitura musical e sem formar escalas.
Claro que essas lacunas de formação o impediam de integrar formações orquestrais e de participar de gravações, mas ainda assim e com o já citado Jimmy Lions ocorreu sua primeira experiência “profissional” em 1944 com 23 anos.
Quando terminou a IIª Guerra Mundial em 1945, TAL FARLOW contava então 24 anos e teve a oportunidade de tocar por 06 meses com o trio da pianista Dardanelle, no clube “Copacabana” de New York. Passou a ser assíduo freqüentador da “Rua 52” (a rua que “nunca dormia”), ocasião em que pode escutar Charlie Parker, Bud Powell, Thelonius Monk e Dizzy Gillespie, entre outros expoentes do recém-criado “bebop” mas, claro, somente ouvindo-os e sem participar como músico; estava convencido de que o novo “gênero” devia ser estudado e tocado.
Tocou na Filadélfia com o trio do pianista Freddie Thompson, em que a guitarra substituía o contrabaixo.
Foi para New York com o pianista Jimmy Lyons e o contrabaixista Lenny, o irmão do clarinetista Buddy DeFranco, já que tinham a intenção de filiar-se ao “Local 802” (vide o artigo 06 sobre o guitarrista Joe Pass, em que comentamos sobre os “Local”) e formar um trio. Enquanto não conseguiam a licença estavam autorizados a tocar sómente em contratos de “01 dia”, o que perdurou por 03 meses.
TAL FARLOW tinha grandes dificuldades em decorrência de seu auto-didatismo, o que o forçou a trabalhar, novamente, em uma loja de cartazes, flâmulas e bandeiras, até que em 1948 foi contratado para substituir o guitarrista Mundell Lowe no grupo da vibrafonista Margie Hyams, atuando no “Three Deuces” de New York.
Morava então com os guitarristas Jimmy Raney e Sal Salvador e com o grande saxofonista Phil Woods, tocando muitas vezes com o primeiros deles.
Em 1949 integrou o sexteto do clarinetista Buddy DeFranco, ao lado do grande vibrafonista Milt Jackson e do contrabaixista John Levy.
No final desse ano foi convidado pelo vibrafonista Red Norvo (egresso da “big.band” de Woody Herman e ex-marido da cantora Mildred Bailey, de quem havia se separado em 1945), indo para a Califórnia tocar no seu trio, completado pelo contrabaixo de Red Kelly (que logo deixou o trio para integrar a banda de Charlie Barnet, sendo substituído por Charles Mingus).
Para TAL FARLOW esta foi uma fase muito proveitosa para sua formação técnica, já que tendo no início sentido enorme desconforto pelos ritmos extremamente rápidos imprimidos por Red Norvo (herança da atuação desse vibrafonista com o clarinetista e “band-leader” Woody Heerman), teve que estudar muito para melhorar sua técnica.
Deixou Red Norvo e uniu-se ao clarinetista e “band-leader” Artie Shaw em seus “Gramercy Five”, já então como um guitarrista sumamente habilidoso e criativo em seus solos.
Retornou em 1954 a tocar com Red Norvo por 05 meses e logo abandonou a música: estávamos em 1955.
Mesmo considerando-se “aposentado”, conheceu na Califórnia o proprietário do clube “Composer” de New York, que o convenceu a trabalhar fixo e em trio no clube, ao lado do pianista Eddie Costa e do contrabaixista Vinne Burke, o que efetivamente ocorreu até o fechamento do clube em 1958.
Nessa ocasião TAL FARLOW casou-se e foi residir em uma mansão na costa do Atlântico, em Sea Bright: seu interesse pelo JAZZ restringia-se aos discos, aos programas radiofônicos e às visitas dos músicos que iam para sua mansão tocar e conversar, entre os quais e como mais assíduos Jim Hall, Jimmy Raney, Gene Bertoncini e Attila Zoler.
Retornou à cena em 1967 para um contrato de 02 meses no “The Frammis Club” de New York e gravou para o selo Prestige ao lado do saxofonista Sonny Criss.
Participou do “Newport Jazz Festival” de 1968.
Na costa oriental e em St. Louis tocou com o “George Wein’s All Stars”, novamente ao lado do vibrafonista Red Norvo, isso em 1969 (lembra-se que George Wein, pianista, foi o produtor e organizador do “Newport Jazz Festival”).
Novamente participou do “Newport Jazz Festival” nos anos de 1970 e de 1972, mas já a essa altura dedicando a maior parte de seu tempo ao ensino da guitarra, assim como a redigir seu método, lançado no livro “Tal Farlow Method”.
Esporadicamente atuava em escolas, clubes, institutos e associações.
Ainda assim atuou na Europa, gravou e apresentou-se com Sam Most, Mike Nock, George Duvivier, Tommy Flanagan (com quem já havia gravado em grupo liderado por Artie Shaw e citado ao final do presente artigo na relação de gravações) e outros.
Em cada uma das suas visitas à França, apresentou-se em duo com Philippe Petit.
O guitarrista TAL FARLOW foi vencedor de diversas enquetes de publicações e órgãos especializados em JAZZ: os mais destacados deles foram Esquire, Down Beat e Metronome, por sua importância como veículos divulgadores do JAZZ, a "Arte Popular Maior".
Inicialmente seu toque nos remete a Jimmy Raney e a Lennie Tristano, mas sem a “linguagem” abstrata deste, em TAL FARLOW substituída pelo concretismo, pelo classicismo moderno; mas sem dúvida alguma sua forte influência tem origem em Charlie Christian, com grande sentido harmônico, muito desenvolvido, fecunda imaginação melódica, incialmente auto-didata e, ao final, um “virtuose” técnico, considerado logo após Django Reinhardt um dos maiores estilistas da guitarra no JAZZ.
Com propriedade e segundo Joachim E. Berendet no seu “El Jazz – De Nueva Orleans a Los Años Ochenta” (Editora “Fondo de Cultura Económica”, México, 2002, 900 páginas), “desde Tristano y antes de Sonny Rollins no ha habido quizá outro jazzista que se lanzara com líneas tan largas, inacabables, que se renuevan constantemente em si mismas, como lo hace FARLOW por encima de coros, períodos, frases y partes centrales”.
TAL FARLOW mandou fabricar uma guitarra com diapasão curto, o que lhe permitia um fraseado extremamente veloz e uma sonoridade muito suave. Essa guitarra lhe permitia tocar e golpear as cordas com as pontas dos dedos, obtendo efeitos rítmicos muito bons (para, em conseqüência, dispensar o acompanhamento de bateristas).
Foi moderno se observarmos sua ilimitada coerência e rigor ao “tecer” complexas linhas, prolongadas, efeitos obtidos apenas com o roçar dos dedos ou apenas sugeridos, além de sobriedade que habitualmente escapa aos guitarristas de JAZZ, muitos deles mais preocupados com o “virtuosismo”.
Em uma entrevista concedida para a “Metronome” em 1958, TAL FARLOW dizia que para ele a guitarra deveria ter uma sonoridade “natural”, de guitarra. Quanto á sua predileção pelos tempos rápidos, dizia que se sentia mais confortável neles que nas “baladas” (tradução e adaptação livres a seguir): “é muito difícil manter uma nota em uma guitarra amplificada nos tempos lentos, particularmente no registro alto; somente Johnny Smith consegue isso porque modificou a amplificação; quanto às “eight-note line” que freqüentemente utilizo nas improvisações, são inconscientes e, talvez, para suprir a falta de um baterista, que normalmente dispenso atuando como tal na guitarra (como fazia Mary Osborne)”.
TAL FARLOW deixou-nos registros discográficos importantes, tanto por sua atuação, quanto por seus “parceiros” musicais, já que gravou com Artie Shaw, Sonny Criss, Red Norvo, Buddy DeFranco, com a “George Wein’s Newport All Stars” e, como líder, destacam-se, entre outras, as seguintes gravações:
· Early Tal;
· Tal Farlow Quartet;
· Guitar Artistry Of Tal Farlow;
· Harold Arlen by Tal Farlow;
· This Is Tal Farlow;
· Swinging Guitar of Tal Farlow;
· Autumm In New York;
· Tal Farlow Second Set;
· Return Of Tal Farlow;
· Tal ’78;
· Tal ’80.
Uma das melhores gravações para ouvir-se TAL FARLOW como acompanhante e como solista é o estojo com 02 CD’s e precioso encarte “Artie Shaw – The Last Recordings Rare & Unreleased” (selo “Musicmasters Jazz”, USA, 1992). Os 02 CD’s contem um total de 20 faixas, sendo que em 13 delas temos o guitarrismo de FARLOW, sendo 05 clássicos: “Imagination”, “Besame Mucho”, “ICan’t Get Started”, “Tenderly” e “Someone To Watch Over Me”; mais 08 temas da autoria de Artie Shaw, a saber, “The Sad Sack”, “Mysterioso” (nada a ver com Thelonius Monk), “The Chaser”, “Pied Piper Theme”, “Love Of My Life”, “Lyric”, “Lugubrious” e “When The Quail Come Back To San Quentin” (faixa que havia sido originalmente gravada por Artie Shaw com seu grupo “Gramercy Five” em 1940, portanto sem TAL FARLOW que somente iniciou sua colaboração com Artie Shaw no final dos anos 1940, sendo que nessa primeira gravação a formação incluiu Billy Butterfield e Johnny Guarnieri) .
Em todas essas 13 faixas a formação do grupo é a mesma: Artir Shaw / clarinete, Hank Jones / piano, TAL FARLOW / guitarra, Tommy Potter / baixo, Joe Roland / vibrafone e Irv Kluger / bateria.
TAL FARLOW teve personalidade marcante por sua tranquilidade, muito bem retratada no documentário “Talmage Farlow”, em que discorre sobre sua vida e atua ao lado de Red Norvo e Charlie Mingus (anos 50), assim como de Tommy Flanagan e Red Mitchell (anos 80); se esses não são parceiros “fora-de-série”, desconheço onde FARLOW poderia ter encontrado outros.


Retornaremos à guitarra e aos guitarristas em próximo artigo
apóstolojazz@uol.com.br

5 comentários:

Beto Kessel disse...

Caro Apostolo,

Quando conversava com o Luiz Fernando Senna na Modern Sound e falava que era fa da guitarra no Jazz, ele sempre me dizia para ouvir Tal Farlow, um dos gigantes na guitarra...

Vou pesquisar.

Abracos,

Beto

Érico Cordeiro disse...

Meu caro Apóstolo,
Mais uma aula sobre um grande músico - tenho uns quatros cdss dele e todos de excelente qualidade. Escrevi sobre ele no barzinho: http://ericocordeiro.blogspot.com/search/label/Tal%20Farlow
Grande abraço e mais uma vez, um tiro certeiro na mosca!

Nelson disse...

Presado "Apostolo",

Mais um tiro, "na mosca". Uma pena, que só tenha saído no Brasil - que eu saiba e há muitos anos atrás - um único LP desse excelente guitarrista. O título era:
"Esse é o TAL"
Como alusão atribuida, na época (anos 50/60), de uma figura ímpar, como se diz hoje:
"Esse é o Cara"
Obrigado pela excelente resenha.

Abçs.
"Nels"

APÓSTOLO disse...

Prezados BETO e ÉRICO:

Ao primeiro afirmo que ouvir TAL FARLOW será para você uma descoberta mais que gratificante = é um desses super-dotados em que o auto-aprendizado levou-o à busca incessante da NOTA CERTA; mais tarde e com o estudo formal, completou-se.
Ao estimado ÉRICO, grato e seguimos na trilha de devolver para todos o pouco que conseguimos ver, ouvir e ler = quem guarda JAZZ para sí, perde a imensa oportunidade de aprender com os demais (essa é uma das muitas e incontáveis lições que aprendí com Mestre LULA (o do bem).

APÓSTOLO disse...

Prezado NELSON:

Grato pelo comentário. Realmente e até onde tenho notícia sómente o "Esse é o Tal" foi lançado entre nós. Tal como no texto da postagem, recomendo com firmeza a audição do "Artie Shaw - The Last Recordings Rare & Unreleased", com uma constelação de mestres.