Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho); David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels), Pedro Cardoso (o Apóstolo), Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge) e Geraldo Guimarães (Gerry).

HISTÓRIAS DO JAZZ N° 38

29 maio 2007

A tragédia de Frank Rosolino

Como escrevi antes, os dois festivais de Jazz São Paulo/Montreux realizados em 1978 e 1980 foram o grande cenário para o surgimento de algumas histórias que conto nessa série. Essa, que entristeceu a todos que conheceram de perto Frank Rosolino , será transcrita da matéria que escrevi na “Tribuna da Imprensa” em 27 de dezembro de 1979, na época o único jornal que noticiou o fato.

“A Tragédia de Frank Rosolino “
A notícia é do “Melody Maker”, edição de 2 do corrente, que em apenas treze linhas condensa toda uma tragédia.
“Frank Rosolino , o trombonista de Jazz da West Coast , foi encontrado morto em Los Angeles na segunda feira. A polícia acredita que ele atirou e matou seu filho de onze anos, ferindo de forma grave um outro filho de sete, antes de atirar em si próprio. Rosolino fez seu nome com a orquestra de Stan Kenton,nos anos cinqüenta e participou de inúmeras sessões de gravação na West Coast.”
Fica difícil acreditar que um músico talentoso e com um temperamento alegre e tranqüilo viesse a por termo a vida , de forma trágica,laconicamente descrita pelo jornal inglês.
Conhecemos Frank Rosolino pessoalmente,no Festival de Jazz de São Paulo e com ele travamos ótimas relações de amizade. Estávamos no bar do Hotel Eldorado,quartel-general dos músicos que participavam do evento , conversando com Jimmy Rowles ,Ray Eldridge e Benny Carter. Rowles desenhava “cartoons” a nosso pedido,focalizando suas concepções sobre pianistas de sua preferência. Chega Raul de Souza e diz : “Lula , a fera chegou; você não queria conhece-la ? “
Ao seu lado,elegantemente trajado, com vistoso paletó branco , sorridente e bem humorado, Rosolino estende a mão e cumprimenta a todos. Senta-se ao nosso lado, pede uma cerveja e se interessa vivamente pelos desenhos de Rowles.
O astuto pianista acabava de desenhar uma caricatura de Oscar Peterson ,mostrando um rotundo crioulo,com enorme guardanapo no pescoço,cruzando talheres no ar e olhando avidamente para o piano à sua frente . A marca do instrumento: “Mine all mine.” ! O papel passa de mão em mão provocando gostosas gargalhadas. Rosolino me solicita os outros “cartoons”. Examina atentamente as concepções de Rowles sobre Erroll Garner, Art Tatum e George Shearing. Repetia a cada instante :” It’s lovely Jimmy ! “ . Rowles continua desenhando e sorrindo sorrateiramente. Termina o trabalho e nos estende o papel disparando sonora gargalhada. Era um “cartoon” dos mais picantes , no qual Rowles se retratava como um garçom despido, oferecendo um”soft drink” a uma dama sentada à mesa. Novas gargalhadas. Apresso-me em guardar a caricatura mas Rosolino protesta. Toma o papel das minhas mãos e diz : “Você deve ser um perigoso jornalista. Vai publicar isso e deixar Jimmy em má situação . Deixa que eu fico com esse” , enquanto guardava o desenho no bolso do paletó, piscou o olho e sorriu maliciosamente.
O assuntoapassa a ser Jazz e perguntamos a Frank se haveria possibilidades dele interpretar “Lemon drop” no Festival. Respondeu sempre rindo : “Por mim tudo bem Lula. Depende do “Souzabone” e dos músicos com quem irei tocar. Se eles quiserem,poderemos tentar.”
Nesse mesmo dia iria encontra-lo , já de volta do Anhembi,num desconfortável botequim situado em frente ao hotel. Em pé,junto a um estreito balcão estavam Raulzinho, Milton Banana,o contrabaixista Mathias Mattos e alguns circunstantes. Raulzinho entre generosos goles de caipirinha , relembrava os tempos do “Bottle’s”, as jam sessions do “Little Club”, comentando as dificuldades que os músicos tinham em se apresentar. De vez em quando interrompia a narrativa e dirigia-se a Rosolino em inglês. Frank ria e comentava :”Não adianta Raul,se com tanto tempo de “States”
você não aprendeu inglês ,jamais conseguirá. Não entendo nada do que você diz.” E caia na gargalhada.
No dia de sua apresentação chegamos juntos ao Anhembi. Interessou-se logo pela camisa com o emblema do festival e perguntou se poderia adquirir algumas. Levei-o ao “stand” de vendas e quando começava a escolher as cores e tamanhos , foi interrompido por César Castanho que chegou esbaforido. Pegou-o pelo braço informando que a vesperal estava prestes a se iniciar e os músicos já estavam sendo chamados.
Só no dia de seu embarque fui encontra-lo novamente. Estava no “hall” do hotel aguardando a bagagem e tomando outras providências . Quando me viu , interrompeu a tarefa e sempre sorrindo autografou uma antiga foto que ilustra essa matéria . Agradeceu os elogios e se despediu dizendo : “Foi um grande prazer tocar no Brasil. Um país magnífico com um povo alegre e que adora a música. Voltarei sempre que puder.”
Levei-o ate o carro e presenteei-o com um chaveiro com a Bandeira Brasileira, propaganda da semana da pátria. Agradeceu mais uma vez, sempre sorrindo,apertou-me a mão e se foi, para sempre. “
Resolvi escrever para Raulzinho indagando os motivos que levaram Rosolino a cometer aquela tragédia. Raul me respondeu em carta de 19 de março de 1979, cujo trecho reproduzo :
“Você me perguntou na carta que situação era com respeito do Frank , meu amigo ninguém entendeu, nem tão pouco eu que era ligado com ele as pampas, não sei o que houve, só sei por intermédio da mulher dele que a primeira mulher também se suicidou e as segunda também e ele era muito alegre com as pessoas fora de casa, mas em casa, ele era muito inseguro e também muito frustrado, também com o problema da separação é o que eu pensei no momento, mas ninguém sabe ao certo o que foi que houve na cabeça dele quando chegou em um sábado de madrugada às 4.30 da manhã e fez o que fez. Mas todo o dia eu faço uma oração para o espírito dele ficar descansando em paz. “

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