A apresentação de Diana Krall em São Paulo provocou uma crítica no dia seguinte (via Reuters) no mínimo preocupante - o ótimo DVD ao vivo em Paris seria uma farsa? Segundo o autor, Ari Santa Lúcia Jr, foi "um espetáculo burocrático, onde a cantora mostrou pouco carisma, presa, robótica e com receio do novo, do moderno, com estilo distante, sem a menor questão de interagir e tornar o show mais intimista". As críticas recairam também sobre o cenário e até mesmo quanto à disposição dos músicos no palco. Essas observações, todavia, deixavam no ar a competência do articulista que, desavisado ou não, não sabe que em um show de jazz o cenário e a colcocação da banda no palco obedecem apenas uma prioridade: a qualidade do som. Interagir e ter carisma são expedientes mais próprios para Sangalos, Mercurys, Ramalhos e Matogrossos da vida, pouco afeitos a fazer boa música. E, quanto ao repertório, a importância é relativa, já que o bom jazzista é aquele que consegue criar sempre em cima de temas que lhe dizem respeito musicalmente, sejam do tempo "do onça" ou não. Por isso tudo, às pressas, fui
conferir o último show em Curitiba.
Quanto ao Sr. Ari Santa Lúcia Jr, trata-se de um perfeito idiota de plantão, pelo menos em relação a jazz.
Adianto e já peço perdão pela falha. Não tive acesso a qualquer programa do show e os aplausos me impediram de identificar os nomes do baixista e baterista, aliás gratíssimas surpresas, à altura - com louvor - dos habituais John Clayton e Jeff Hamilton. Já o guitarrista, Anthony Wilson
Lady Diana passou durante todo o show uma sensibilidade tocante. Emotiva, simpática, permaneceu focada exclusivamente no único propósito que a fez vir ao Brasil: música honesta. Se parte da platéia em São Paulo , ou mesmo em Curitiba, não sabia que o assunto era jazz, nada a fazer ali e nada a reclamar. Cantora e pianista de inequívoco talento - ao vivo, sem truques, sem maquiagem - exibiu uma concepção de jazz moderna, com harmonias saborosas e improvisos arrebatadores, coadjuvada por um trio de altíssimo gabarito. Aliás, em nome da platéia paulista,
o idiota de plantão reclamou pela ausência dos sucessos do CD "The Look Of Love". Mal sabe que por contrato ela só pode cantar os tais sucessos daquele CD quando acompanhada por orquestra. As versões para "Let's Face The Music And Dance" (Berlin), "All Or Nothing At All" (Altman & Lawrence), "I Love Being Here With You" (Lee & Schluger), "Broadway" (Bird, McRae & Wood) e "Devil May Care" (Dorough & Kirk) arrasaram em swing e solos inspirados. Até mesmo as músicas do último CD, com influência em principio nefasta do canastrão e atual marido, Elvis Costello, receberam tratamento bem mais jazzístico. E na respeitosa versão para "Garota De Ipanema" (Jobim), a sensatez de explicar que não cantaria no idioma original - por motivos óbvios. Em boa parte o idioma reapareceu em uníssono via platéia afinada.
Diana Krall faz jazz. É capaz de reunir milhares de admiradores mesmo num distante Brasil - para ela e seus músicos. Nada é por acaso. Sugerir que tenha comportamento no palco impróprio para uma intérprete de jazz é como se exigisse de Clóvis Bornay uma postura de "machão". E ignorar seu talento - como já o fez Nina Simone, que nunca tocou jazz - é sintoma claro de desconhecimento do assunto ou preconceitos suspeitos.
PS.: A qualidade do som, em Curitiba, sensacional.
PS II.: Mrs. Krall não escapou do "Fantástico". Em compensação - sorte dela - ficou livre do Jô Soares.
PS III.: Ari Santa Lucia Jr é "jornalista, especializado em música". Mantém uma coluna chamada Na Hora Do Rock. Quanto aos shows no Brasil da Norah Jones, achou o máximo...
PS IV.: Confirmando a banda: krall, vocal, piano; Anthony Wilson, guitarra; Robert (Bob) Hurst, baixo (tocou extensivamente com Brandford Marsalis em seu trio/quarteto "Jeep" e Karriem Higgins (último baterista de Ray Brown) (apud Bene-X).
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