Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho); David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels), Pedro Cardoso (o Apóstolo), Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge) e Geraldo Guimarães (Gerry).

Sucesso absoluto do 5º. concerto do Projeto Chivas Jazz Lounge

27 setembro 2003

Como muito bem acentuou Mauro Nahoum em seu magnífico relato, a apresentação do Rio de Janeiro Jazz Trio - tendo à frente o consagrado baixista Paulo Russo - no Mistura Fina foi uma noite para ficar na história do vitorioso projeto Chivas Jazz Lounge, produzida pelo expert David Benechis, um dos integrantes do CJUB - Charutos Jazz Uísque e Blog - idealizadores do evento, patrocinado pela Pernod-Ricard do Brasil, fabricante do Whisky Chivas Regal, e com apoio da empresa Claro (ex-ATL).
Foi o primeiro concerto após a mudança de pouso do Chivas Jazz Lounge, cuja trajetória iniciou-se no extinto Restaurante Epitácio, onde ganhou notoriedade, firmando-se em quatro meses como um projeto que privilegia o jazz, e que a partir de setembro tem como sede o tradicional Mistura Fina.
Caminhando em direção ao Mistura Fina, ainda ao longe, fui agradavelmente surpreendido ao ler no seu toldo, com grande destaque, em maiúsculas, Chivas Jazz Lounge, no melhor estilo do clube Village Vanguard, de New York. Por um momento, meu pensamento voltou-se para a Sétima Avenida, relembrando as maravilhosas noites que através dos anos passei naquele clube de jazz – o mais antigo em atividade em todo o mundo. Ao aproximar-me, voltei à realidade e concluí com meus botões que o Mistura Fina é o Village Vanguard brasileiro.
David Benechis sabia exatamente o que pretendia e o que conseguiria ao convocar o Rio de Janeiro Jazz Trio. O brasileiro Paulo Russo (baixo), o italiano Dario Galante (piano) e o americano Andrew Scott Potter (bateria) são músicos de categoria internacional, como muito bem destacou Mauro Nahoum em sua reportagem irretocável, que atuam juntos há alguns anos e se entendem quase telepaticamente, funcionando em todos os momentos como uma única célula.
Paulo Russo é um dos melhores baixistas brasileiros de todos os tempos, cuja inventividade, virtuosismo técnico e recursos aparentemente ilimitados permitem-lhe executar qualquer frase ou idéia que imagine. Ele é um dos mais influentes da escola moderna do baixo entre nós. Seus solos ousados, repletos de surpreendentes alterações de dinâmica, deixam o ouvinte sempre em suspense aguardando o que virá a seguir. Seus dedos extraem ricas e imaginativas sonoridades que variam do lírico ao vigoroso, utilizando o polegar da mão esquerda para bruscas acentuações que funcionam como sucintos comentários rítmicos para as improvisações da sua agilíssima mão direita. Seus dois features em solo abrindo os dois sets, “Blues for LaFaro” e “Tenderly”, deixaram a estampa de sua fecunda criatividade. E o que dizer dos seus acompanhamentos e troca de quatro compassos eivados de comentários adicionais interagindo com os companheiros ? Só ouvindo para acreditar.
Dario Galante é um portento, projetando virtuosismo, técnica irrepreensível, inventividade, consistência, suíngue e expressão pessoal. Italiano de nascimento e brasileiro por adoção, podemos afirmar que seu envolvimento com o idioma jazzístico tornou-o musicalmente americano. Influenciado por Bud Powell e Thelonious Monk, longe de ser um imitador, filtrou os estilos de ambos os mestres para forjar sua própria identidade. Como a maioria dos temas foi em andamento quase supersônico, seus solos deram a sensação de serem vôos rasantes, porém sempre com direção, propósito e objetividade, especialmente em “Solar”, “I Love You”, “Yesterdays”, “Four” e “Straight, No Chaser”; neste último, cada uma de suas trocas de quatro compassos com os companheiros apresentou uma idéia diferente das precedentes. Cabe aqui repetir uma frase que escrevi há alguns anos em “O Globo”: “A consistência de Galante é uma constante. Ele nunca tocaria mal, ainda que quisesse”.
Andrew Scott Potter é a terceira ponta do vértice do trio. Baterista exuberante, daqueles que tocam pra valer, inegavelmente pertence à escola hard bop; sempre presente com entusiasmo invulgar, transforma pratos e tambores em veículos de grande força de expressão. Sempre atento para acentuar, sublinhar ou instigar seus companheiros, não tem meias medidas para suas vibrantes incursões; na troca de quatro compassos é um dínamo que envereda pelos interstícios da complexidade rítmica. Em muitos momentos, sua execução chama a atenção por marcar três ritmos simultaneamente: a mão direita marcando os quatro tempos do compasso no cymbal (prato), a esquerda golpeando incessantemente o snare drum (tarol) com a extremidade sem a cabeça da baqueta, e o pé esquerdo acionando o high hat (pratos-de-pedal) a cada dois tempos do compasso; isto aconteceu em “Maracabop” (composição de Galante com inequívocas tintas monkeanas), “Jade Visions” (com alterações de andamento 3/4 e 6/4), “I Love You”, “Yesterdays” e “Straight, no Chaser”. A notar que seu solo em “Nardis” privilegiou os movimentos circulares pelos tambores, com mínimas incursões aos pratos.
O bem-selecionado repertório contribuiu para o sucesso da noite, proporcionando uma forte interação com a platéia.
Um conjunto com Dario Galante invariavelmente inclui composições de Thelonious Monk. Este não foi diferente, apresentando “Well, You Needn't”, “Bemsha Swing” e “Straight, no Chaser”, além da mencionada “Maracatubop”, de Galante, influenciada pelo “Alto Sacerdote do Bebop”.
O trio apresentou quatro temas de Miles Davis: “Solar” (baseado em harmonias alteradas de “How High the Moon”), “All Blues” (em andamento 6/4, com sua recorrente figura rítmica que projeta uma atmosfera densa ao longo da interpretação), “Nardis” (jamais gravado pelo autor, levado em surpreendente andamento rápido) e “Four” (um dos muitos temas que Davis apropriou-se indevidamente de outro músico – este de autoria do saxofonista e cantor Eddie Vinson, baseado nas harmonias de “The Most Beautiful Girl in the World”).
Os standards “I Love You”, “Tenderly” e “Yesterdays” (no qual Paulo Russo citou “Luar do Sertão” e “Casinha Pequenina” em seu solo) foram entremeados às composições de jazz. Cabe destacar a única balada da noite, “Mateus”, composição de Paulo Russo dedicada a seu filho, impregnada de profundo lirismo.
Aguardemos em outubro o próximo concerto da série, com produção de Luiz Carlos Fraga, outro integrante do CJUB que sabe das coisas.
José Domingos Raffaelli

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