Série: Histórias do
Jazz
DO
OUTRO LADO DO JAZZ # 8
HARLEM
A parte de New York conhecida
como HARLEM abrange a área norte da ilha de Manhattan, acima do Central Park
entre as ruas 110 e 158, juntando-se a uma faixa ao nordeste conhecida como
Washington Heights, ao oeste a Henry Hudson Parkway marginal ao Rio Hudson e a
leste a Harlem River Drive beirando o próprio rio.
A vila original foi estabelecida
em 1658 pelo governador holandês da província, Peter Stuyvesant, que a nomeou
de Nieuw Haarlem em homenagem à capital da província de North Holland na
Holanda.
Ricos fazendeiros por lá se
estabeleceram até ocorrer um grande declínio econômico nos anos seguintes a
1830 quando, então, fazendas abandonadas foram a leilão público.
A melhoria dos transportes e o
grande crescimento da população de New York após a Guerra Civil transformou o
HARLEM em bairro das classes média e média alta.
A partir de 1870 foi alvo de
extensa exploração imobiliária e por volta de 1904-5 o mercado inflado com
preços e aluguéis exorbitantes entrou em colapso.
Nesta época Philip Payton, homem
de negócios de raça negra, iniciou a compra dos imóveis e, pela primeira vez, a
população afro-americana passou a dispor de ofertas de imóveis decentes e até
mesmo luxuosos.
Desta forma a área foi se
tornando pouco a pouco no centro de uma comunidade afro-americana.
Assim o chamado bairro negro em New York, a partir de 1926, foi sendo vivenciado como um centro jazzístico de grande importância devido às grandes casas de espetáculos, salões de dança e cabarés ali instalados como o Cotton Club, Savoy Ballroom, Connies Inn, Minton’s Playhouse, Small’s Paradise, Apollo Theater, Nest Club, Lafayette Theater, Alhambra Ballroom, Sugar Cane Club e outros.
Entre 1929 e 1935 foi moda o
público branco passar as noites de diversão em uma casa do bairro negro.
Nos anos 40 o HARLEM começou a se
esvaziar como centro musical, mas permaneceu ainda por cerca de duas décadas
como centro espiritual do Jazz, onde morava a maior parte dos músicos e onde se
reencontravam frequentemente em notáveis jam sessions.
Atualmente apenas existem alguns
pequenos clubes de Jazz de segunda linha.
O Harlem Opera House foi
um grande teatro, possuindo 1.540 assentos, localizado em 207 West 125th Street
no coração do Harlem, construído em 1888 pelo empresário Oscar Hammerstein
(*1847 †1919), avô do famoso compositor letrista Oscar Hammerstein II.
Consta que lá Bardu Ali o
vocalista da banda de Chick Webb, descobriu Ella Fitzgerald em um concurso para
amadores.
Há controvérsia de que o concurso
ganho por Ella tenha sido no Harlem Opera House vizinho de quarteirão do
Apollo Theater, que também patrocinava concursos de calouros, mas sem
dúvida foi o Harlem Opera House que a promoveu.
Apesar do nome Opera House muitos
espetáculos além das óperas ali eram realizados já na década de 20 e a partir
dos anos 30 passou a abrigar as Big Bands da Era Swing e, após 1935, foi
mantido apenas como cinema, o magnífico edifício foi demolido em 1969. Algumas
bandas que ali atuaram: Teddy Hill, Don Redman, Charlie Turner, Chick Webb,
Benny Carter, Fletcher Henderson, Tiny Bradshaw, dentre outras...
STRIDE - Entre os anos 1920
e 30 nascia no Harlem uma escola de Jazz a que se denominou de ― “Harlem
stride-piano”, fundamentada na criatividade dos pianistas James P.
Johnson, Luckey Roberts, Eubie Blake e seguidores como Willie "The
Lion" Smith e Fats Waller, dentre outros.
O “Stride” refletia uma
modernização do ragtime e consiste em fazer alternar uma nota baixa (grave)
sobre um tempo forte (3º) e um acorde sobre os dois tempos fracos (2º e 4º).
A partir dos anos 30 as
características do “stride” foram sendo empregadas também pelas bandas, como as
de Ellington e Basie.
Grandes nomes do piano como Fats
Waller, Duke Ellington, Earl Hines, Mary Lou Williams, Pete Johnson, Albert
Ammons, Willie Smith, Count Basie, Teddy Wilson, Art Tatum, Errol Garner, Oscar
Peterson, Thelonious Monk, Rolland Hanna, Jack Byard, Monty Alexander,
foram bastante influenciados pelo “stride”.
Os principais mentores da escola
foram os pianistas James P. Johnson (*1894 †1955), Luckey Roberts (*1887
†1968) e Eubie Blake (*1883 †1993 ―
isto mesmo, 100 anos!).
Um ótimo exemplo como marco do “stride”
é a gravação de 1921 do tema “Carolina Shout”, interpretado por seu autor,
James Price Johnson, que pode ser ouvida a seguir. (observem as notas da mão
esquerda, notas baixas onde de configura o stride).
HARLEM RENAISSANCE - foi
um período que se estendeu do final da 1ª Guerra Mundial até meados dos anos
30, período este no qual eclodiu um movimento intelectual na região do Harlem,
envolvendo grupos de artistas muito talentosos em vários gêneros como
literatura, teatro, música e artes em geral, considerado como a própria
afirmação e sedimentação da cultura de origem afro-americana.
O JAZZ exerceu enorme influência
na música e na dança durante o que foi denominado de ― A Era do Jazz, mais
precisamente a década dos anos 1920 como parte da Renaissance.
Os estilos e linguagens
características influenciaram até muitos compositores clássicos modernos e o
JAZZ, como cultura, emigrou para várias cidades não mais apenas como uma
saltitante música de dança, mas como real arte negra. Contudo, esta migração não foi somente
através dos EUA, indo se afirmar na Europa, tendo inclusive Paris se tornado o
centro musical europeu do Jazz.
RENT A PARTY -
literalmente “festa de aluguel”, era a expressão que designava as festas
informais realizadas pela população negra do Harlem, com o propósito de
conseguir dinheiro para as despesas de aluguel. Muito comuns nas décadas de 20
e 30, também eram conhecidas como “house party”. Eram convidados músicos,
especialmente pianistas, a fim de que tocassem Jazz e o estilo pianístico de
execução do blues ― o boogie woogie e o stride ― eram bastante popular.
Nomes consagrados das “house
parties” eram James P. Johnson, Fats Waller, Pete Johnson, Cow Cow
Davenport, Meade Lux Lewis, Bessie Smith, Clarence Williams e outros.
O repertório musical alusivo a
estas reuniões é vasto destacando-se: House Rent Blues (Clarence
Williams-1923), House Rent Ball (Fletcher Henderson-1924), House Rent
Rag (Dixieland Jug Blowers-1926), Rent Party Blues (Duke
Ellington-1929), House Rent Party Day (Wingy Manone-1935), dentre
outros...
Para ilustrar as “Rent Parties” o
blues “Gimme A Pigfoot” (*)
(Wesley Wilson) com Bessie Smith acompanhada pelos Buck & Band
formada por Buck Washington (pi, líder), Chu Berry (st), Benny Goodman (cl),
Bobby Johnson (gt), Frank Newton (cornet), Billy Taylor (bx), Jack Teagarden
(tb) – (Okeh 6893 – 24/11/1933), é um bom exemplo.
(*) Pigfoot ―uma comida típica do sul dos EUA passou a ser tradicional nestas festas, em princípio pela própria cultura negra e também por ser bem barata; trata-se de um ensopado com pés de porco tipicamente servidos com salada de batatas.
2 comentários:
Mais um formidável artigo Major!
Carlos Lima
Interessantíssima essa história sobre o Harlem. Grato por mais essa aula, MaJor!
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