Tentando por a casa em ordem. E em dia...
Manuel Valera, outro cubano a brilhar na cena do jazz
Por Luiz Orlando Carneiro
"A Ilha de Cuba produz, além de charutos e rum, excepcionais
pianistas de jazz que não devem ser rotulados, apenas, como especialistas no
chamado Afro-Cuban jazz. Os exemplos mais eloquentes são os magníficos Bebo
Valdés (1918-2013) e seu filho Chucho – este ainda ativo, aos 72 anos, e
detentor de nada menos do que oito grammies, conquistados entre 1979 e 2012.
Além dos já canonizados Valdés, gozam de justo prestígio, no
planeta jazz, mestres do teclado como Hilario Durán, Omar Soza e Gonzalo
Rubalcaba (Grammy winner com o CD Supernova, Blue Note, 2001). Mais
recentemente, foram elevados à categoria de rising stars (estrelas em ascensão)
os cubanos Aruán Ortiz, Roberto Fonseca, Fabián Almazan, Alfredo Rodriguez e
Manuel Valera - todos eles radicados nos Estados Unidos, com discografias já
significativas, e agendas cheias de compromissos em clubes e festivais.
O CD mais recente e relevante dessa turma mais nova, que se
formou nas até hoje afamadas escolas de música de Havana, é de Manuel Valera, e
tem o título de Self portrait (Mavo Records). É o oitavo álbum do pianista de
33 anos, mas o primeiro totalmente solo, na companhia – apenas – de um Steinway
restaurado de 1918. Os seus registros anteriores foram feitos à frente do New
Cuban Express, um sexteto decubop (Cuban bebop), tendo como principais
parceiros o saxofonista alto Yosvany Terry e o guitarrista Tom Guarna.
Self portrait é uma seleção de 13 faixas, das quais oito de
autoria do pianista, incluindo três “impromptus” (literalmente improvisos) nas
quais Valera exibe, especialmente, a sua intimidade com a música dita erudita,
aquela que estudou no conservatório: o nº 1 (4m40) é dedicado a George Gershwin
(1898-1937); o nº2 (2m30) a Erik Satie (1866-1925), o “minimalista” autor das
Gymnopédies; o nº3 (1m55), a Nicolas Slonimsky, compositor e maestro nascido na
Rússia, mas que emigrou cedo para os Estados Unidos, onde morreu, em 1995, aos
101 anos. Há também uma peça no mesmo espírito dos impromptus, intitulada,
simplesmente, Improvisation (2m25).
O virtuosismo clássico de Manuel Valera é ainda realçado na
articulação dos seus românticos arpejos, em contraste com o fraseado em
contraponto da outra mão, sobretudo em Spiral (5m55), Water (6m40) e Hope
(5m55). Mas na última faixa, Blues (3m40), o cubano de Havana, sediado em Nova York, é a própria
encarnação de um Bobby Timmons ou de um Red Garland.
Valera não poderia deixar de incluir num álbum intitulado
“Autorretrato” composições de ícones do teclado jazzístico que o marcaram ou o
influenciaram, de um modo ou de outro. E escolheu três preciosas joias que são
relapidadas com arte e engenho próprios, sem prejuízo de suas estruturas
melódico-harmônicas originais: Very early (5m35), de Bill Evans; Hallucinations
(3m40), de Bud Powell; Ask me now (6m30), de Thelonious Monk. (32)
Também fez questão de relembrar as melodias de dois boleros
que, certamente, ouviu muito em sua casa, quando garoto: Solamente una vez
(5m20), de Agustín Lara (1900-1970), e Las perlas de tu boca (5m15).
Na apresentação de Self portrait, Manuel Valera escreveu:
“Espero que este disco ajude a pintar, para o ouvinte, um retrato de onde estou
vindo e também para onde estou indo como pianista e compositor”."
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