Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho)*in memoriam*; David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels)*in memoriam*,, Pedro Cardoso (o Apóstolo)*in memoriam*, Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge), Geraldo Guimarães (Gerry).e Clerio SantAnna

Dizzy Gillespie no Brasil, 1956 - Série, por Arlindo Coutinho

30 julho 2004

continuação

III.

Na véspera da sua ida para São Paulo, Dizzy encontrou o Maestro Cipó após seu concerto de encerramento no Teatro República. Recusando vários convites para jantar, homenagens, etc, me chamou no canto do camarim e sussurrou: "Vamos sair daqui e vamos ao encontro do samba". Apesar de alegar que teria de acordar cedo, e dizer a John (Birks Gillespie, para quem não leu as partes anteriores) que estava cansado e que em meu lugar iriam acompanhá-lo o Lula (Luiz Carlos Antunes) e Pézinho (Antonio Luiz Figueira Barbosa), Gillespie me falou: "Eles podem ir, mas você vai comigo também, e de bonde". Depois soube que Lula e Pézinho foram jantar com Quincy Jones. E essa história, conto depois.

Saímos do República por volta da meia noite, de carona com outro jazzista, o saudoso Alex Kitover, que nos levou até a boate Beguine, onde Cipó atuava com seu quinteto, o Copa 5, onde figuravam ele próprio, no sax tenor, Luiz Marinho ao piano, Julio Barbosa no trompete, Vidal no contrabaixo e Sut Chagas na bateria. Ao chegarmos John se surpreendeu com os arranjos do Cipó e me perguntou: "O que é isso?" Respondi-lhe que Cipó tocava samba-bop (sambop, para alguns).

Aqui, um parenteses. O primeiro disco de bebop gravado no Brasil foi um de 78 rpm, selo Sinter, lançado em 1955 com os músicos que venceram em sua categoria o concurso promovido por Paulo Santos em seu programa "Em tempo de jazz" ma Rádio MEC, "Inetta", de composição, arranjos e regência do Maestro Cipó.

Gillespie ficou doido. Gritava, aplaudia e, para delírio nosso, foi chamado ao palco para uma noite inesquecível. A jam terminou bem tarde, cerca das 4 horas da manhã. Cipó e Gillespie ainda traçaram ali planos futuros, com Cipó comprometendo-se a levar John a um ensaio de escola de samba na próxima vinda deste ao Brasil, o que de fato ocorreu anos mais tarde.

À saída, lembrei-me de perguntar a John a que horas sairia seu vôo para São Paulo, já que ele teria de viajar ainda naquele dia. Para variar, ele de nada sabia. E já se iam uma oito da manhã quando Gillespie resolveu ligar para sua mulher Lorraine e perguntar a que horas seria o vôo. Quando soube que seria às 3 da tarde, disse: "Temos tempo, vamos tomar o café da manhã". Cipó gentilmente recusou o convite, alegando ter compromisso com uma gravação, etc., e se mandou. Adivinhem para quem sobrou o "breakfast"?

A essa altura eu não sentia mais nada, só me lembrava que teria de trabalhar com a mesma roupa pois não havia mais tempo de ir em casa. Dizzy e eu conversamos sobre o que aconteceu naquela noite, ele havia ficado impressionado com a qualidade dos músicos brasileiros pois não podia imaginar que aqui também havia dessas "usinas" musicais, na arte de fabricar swing e disse que até então via nos músicos cubanos uma nova visão musical, em termos de criatividade. E disse que a partir dali iria se aprofundar nos ritmos brasileiros.

Estavamos assim conversando quando a doce figura de Lorraine chegou, me cumprimentou e disse, naquele seu tom delicado: "John, acho melhor você descansar um pouco, escolher a roupa que vai usar pois vou fazer compras na cidade e já volto. Vá dormir pois temos muito o que fazer em San Paolo". Isso foi tudo. Despediu-se e saiu. Esse foi o gancho para que eu também decolasse, para tomar um banho, mudar de roupa e talvez ir trabalhar. Ao me despedir, John me disse: "E você não vai ao aeroporto?"
"Claro que vou!", disse eu. Marquei a hora e fui à luta.

Quarenta minutos antes do embarque, cheguei lá e encontrei todos os músicos menos o boss. Falando com Quincy Jones, Benny Golson e Phil Woods, manifestei minha preocupação pois o tempo passava e ele não aparecia. Então Golson me disse: "Se você quer continuar amigo dele, não faça perguntas sobre o atraso do John. É assim mesmo. Quando se fala em aviões, ele é o último a embarcar. Lorraine já tratou de tudo".
Isso dito, nada mais perguntei sobre o assunto e aproveitei para me despedir dos músicos dos quais ficara amigo.

Foi quando vi, no check-in, Melba Liston e Lorraine. Fui até eles, fiz as despedidas de praxe e fiquei aguardando John. Faltavam exatos dez minutos para a partida do vôo quando "ele" surgiu. Ao me ver, gritou: "Hey, Coutino (!), are you ok? You look like shit!". Mais uma vez ele estava certo, ele inteiro e eu um caco, a barba por fazer, o terno amarfanhado e louco de cansado.
Despedimo-nos, com os agradecimentos de lado a lado, eu com a alegria de ter conhecido uma das mais fantásticas e extraordinárias figuras humanas que encontrei em minha vida. Nessa despedida inicial, meus olhos se encheram de lágrimas. Era o início de uma amizade que iria durar quase quarenta anos.

Queria, finalmente, fazer o registro da excepcional banda que veio ao Brasil nessa oportunidade.

Trompetes: John Birks "Dizzy" Gillespie, World Stateman, cidadão do mundo; Quincy Jones; Bama Warwick, Emett V. Perry;
Saxofones Altos: Phil Woods, Jimmy Powell;
Saxofones Tenores: Benny Golson, Billy Mitchel;
Saxofone Barítono: Marty Flax;
Trombones: Melba Liston, Frank Rehack, Rod Levitt;
Piano: Walter "Baby Face" Davis Jr.;
Contrabaixo: Nelson Boyd;
Bateria: Charlie Persip.

Fim da Primeira Série

Nenhum comentário: