Marquis Hill é a nova estrela do trompete
por Luiz Orlando Carneiro, em 15/11/14
A Thelonious Monk Institute of Jazz Competition é a mais
importante disputa anual aberta a jovens músicos de talento comprovado em busca
de renome. O vencedor ganha – além de US$ 25 mil – um contrato de gravação com
a Concord Music. Nos três primeiros anos, o certame era exclusivamente para
pianistas, e abriu caminho para as brilhantes carreiras de Marcus Roberts, Ted
Rosenthal e Bill Cunliffe. A partir de 1990, foi estendido a outros
instrumentistas (e também vocalistas), em sistema de rodízio.
Neste último domingo (8/11), em concerto de gala no Dolby
Theater, Los Angeles, a 28ª Thelonious Monk Competition, dedicada a
trompetistas, premiou Marquis Hill, 27 anos, nascido e criado em Chicago, onde
se formou pela DePaul University. O segundo e terceiro colocados foram,
respectivamente, Billy Buss, de Berkeley, California; e Adam O'Farrill,
novaiorquino do Brooklyn, filho e neto de dois grandes chefes de orquestras
especialistas no Afro-Cuban jazz: Arturo e Chico O'Farrill (1921-1981).
Como sempre, o corpo de jurados reuniu eminentes jazzmen –
desta vez, é claro, ases do trompete: Quincy Jones, Randy Brecker, Jimmy Owens,
Arturo Sandoval, Roy Hargrove e Ambrose Akinmusire (este, o mais jovem do júri,
e vencedor da Thelonious Monk Competition de 2007).
Marquis Hill não é um ilustre desconhecido. Pelo menos na
movimentada cena jazzística de Chicago, embora só agora vá ter acesso a um
público bem maior, a partir dos próximos álbuns a serem gravados e distribuídos
pela etiqueta Concord.
A discografia de Hill na condição de líder começou em 2012,
com o álbum Sounds of the city, por ele mesmo produzido e editado, e que contou
com dois convidados de peso: o saxofonista Greg Ward e o guitarrista Bobby
Broom (um dos sidemen preferidos de Sua Excelência Sonny Rollins). No ano
seguinte, o trompetista lançou The poet (Skiptone), à frente do seu conjunto Blacktet
(Christopher McBride, sax alto; Joshua Thomas, vibrafone; Josh Moshier, piano;
Joshua Ramos, baixo; Makaya McCraven, bateria).
Agora em outubro, no mesmo selo indie, saiu Modern flows EP,
vol. 1, gravado em junho último, com o mesmo Blacktet. As 10 faixas do disco já
estão disponíveis em iTunes, e exibem – além da técnica e da criatividade do
pistonista rising star – composições e arranjos do líder em que os sopros e o
vibrafone se harmonizam numa linguagem pós-bop refinada por sobre uma pulsação
percussiva que remete, constantemente, à street dance. Em I remember Summer
(4m30), King legend (2m45) e Legend's outro (3m30) os vocais pop ou na base
dohip-hop sobrepõem-se à linguagem puramente jazzística. Mas os jazzófilos
avessos a tais “desvios” vão certamente apreciar as demais faixas da seleção,
principalmente Black harvest (5m), White shadows (7m10) e When we were kings
(4m45).
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Mestre Tom Harrell faz nova viagem em 'Trip'
por Luiz Orlando Carneiro, em 22/11/14
O trompetista-compositor Tom Harrell foi personagem desta
coluna há um ano (16/11/2013), por ocasião do lançamento do álbum Colors of a
dream, no qual liderava um sexteto sem piano e com dois contrabaixos (Ugonna
Okegwo e Esperanza Spalding), além de Wayne Escoffery (sax tenor), Jaleel Shaw
(sax alto) e Jonathan Blake (bateria). Foi o sexto disco de uma série primorosa
editada pela etiqueta HighNote, a maioria com o quinteto integrado por
Escoffery, Okegwo, Blake e o pianista Danny Grisset. Os outros títulos foram: Light on (2006), Prana
dance (2009), Roman nights (2010), The time of the sun (2011) e Number five
(2012).
No trompete ou no flugelhorn, aos 68 anos, Tom Harrell é um
mestre em matéria de engenho, arte e poética musical, no mesmo nível de
excelência de Kenny Wheeler (1930-2014) e dos também mais idosos Enrico Rava e
Tomasz Stanko.
Para gáudio de seus cultores, ele está de novo em evidência
(sempre graças à HighNote) no CD Trip, agora à frente de um pianoless
quartetcom o cada vez mais cotado saxofonista tenor Mark Turner, o fiel Ugonna
Okegwo e o baterista Adam Cruz.
O novo quarteto também se chama Trip, e “viaja” a partir de
peças escritas por Harrel. Mas com espaços abertos para diálogos e solos
cativantes do líder e do saxofonista, e participações ativas do baixista e do
baterista, que não se contentam apenas com a faina de sustentação rítmica, e se
tornam – quando chamados – protagonistas em pé de igualdade com os principais
atores.
A parte central do álbum é ocupada pela suíte Adventures of
a Quixotic character – inspirada, é claro, nas andanças do Dom Quixote de La Mancha de Cervantes. São
seis faixas (21 minutos de duração no total), das quais dois intermezzos em
torno de um minuto cada (o camerístico The duke and the duchess e Sancho and
Rocinante). A “viagem” começa pomposa em The ingenious gentleman (7m), com
realce para a bateria de Adam Cruz, e continua fluente e inspirada, numa
sucessão muito bem dosada de moods e solos, em Enchanted(3m), The princess
(6m35) e Windmills (3m45).
As faixas do CD que não integram a suíte são as duas
primeiras e as quatro últimas, com duração total de 30 minutos. São menos
arquitetadas do que a obra central, mas nem por isso menos refinadas em matéria
de estrutura melódico-harmônica. Além disso, têm campo mais livre para os solos
preciosos de Tom Harrell, capaz de um lirismo ardente, mas sempre em estado de
suspense. E também para maior exposição de Mark Turner, 49 anos, que o
igualmente conceituado Ravi Coltrane, seu contemporâneo, considera “um dos mais
importantes saxofonistas surgidos nos últimos 20 anos, e facilmente o mais
influente”.
Destas faixas de Trip, as mais memoráveis são: a de
abertura, Sunday (5m30), bluesy, em andamento relaxado; Cycle (6m10), tema
complexo, espiralado, um tour de force em que se empenham com êxito os quatro
membros do grupo; There (7m05), dançante, groovy, com solos generosos e
descontraídos de Harrell e Turner; a balada Coming home (6m40), na qual reluz,
especialmente, o fugelhorn do líder.
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