Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho); David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels), Pedro Cardoso (o Apóstolo), Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge) e Geraldo Guimarães (Gerry).

ROY HARGROVE QUARTET, MISTURA FINA, 18 E 20/01/2005 - @@@@@

22 fevereiro 2005

Perguntado, dois ou três anos atrás, como definiria um "momento mágico" no Jazz, Ira Gitler, o legendário crítico americano, não hesitou:

"Ouvir Roy Hargrove, num 3º set de sábado, no Village Vanguard".

Quem dizia era o mesmo Gitler que testemunhou praticamente toda a história do Jazz.

Nem Armstrong, Parker, Miles, Coltrane, Hawkins, Webster, Tatum, Powell, ou tantos outros gênios de cuja arte privou com inigualável intimidade. O "momento mágico" de Gitler é "Roy Hargrove, num 3º set de sábado, no Village Vanguard".

Sorte do público carioca, que, por dois dias, 18 e 20 de janeiro, pode também partilhar não de um, mas de vários "momentos mágicos" com que o quarteto de Roy Hargrove e o Trio da Paz, em estelar double bill, nos presentearam.

O trompetista retornou ao Brasil em excepcional companhia, trazendo John Lee no baixo elétrico, Willie Jones III , na bateria e o repatriado Guilherme Vergueiro ao piano. Como convidada especial, Roberta Gambarini, cantante radicada em Nova York.

Hargrove não deixou dúvida. De sua geração e das que vieram depois, não há trompetista mais completo. Um timbre altamente distintivo e magnético, tanto no trompete quanto no flugel; o fraseado sempre original e musicalmente consistente; a técnica titânica e a excelência também na composição: todos estes predicados, inobstante sua juventude, já reservaram a Hargrove lugar cativo no Olimpo da "música dos músicos", ao lado dos mitos Armstrong, Eldridge, Navarro, Gillespie, Miles, Clifford Brown, Lee Morgan, Freddie Hubbard e Marsalis, entre outros poucos.

As recentes apresentações deixarão para sempre na lembrança:

- o lirismo imcomparável de seu flugel nas baladas, em especial a estonteante Fools Rush In;

- o domínio também da latinidade que tanto influenciou o jazz, no bolero, tratado "quasi rumba", Contigo Aprendi, com direito a citações de La Barca;

- o respeito absoluto por Birks, nitidamente privilegiado no set list - talvez pela presença de Lee, antigo sideman de Dizzy - e de cujo repertório ouvimos memoráveis versões supersônicas de Blue´n Boogie e Bebop, sem contar a bissexta This Lovely Feeling.

Vieram também esplendorosos originais como Burn Out, Fun as It Gets e Clear Thought, e, na voz da afinada Roberta Gambarini, os clássicos Stardust, Day Dream, e Only Trust Your Heart. Esta última contou com a inusitada (e não agendada) participação do desconhecido e voluntarioso gaitista holandês Tim "Harmony" Welvaars, grande surpresa do 1º set do dia 18, "convidando-se" ao palco, porém impressionando pela desenvoltura e musicalidade de seus solos, fruto - soube-se depois - de dez anos estudando com o mestre supremo da harmônica, Toots Thielemans.
Hargrove atacou também um furioso funk baseado em Straight Life, do Freddie Hubbard anos "Creed Tatlor/CTI", mostrando ainda grande categoria também na música brasileira, ao acompanhar Vergueiro e o Trio da Paz em Só Danço Samba, quando, todos no palco, celebraram a excelência de tão afortunada reunião, promovida pelo Mistura Fina.

Guilherme Vergueiro teve, então, seu grande momento, mostrando porque é um dos principais pianistas, no mundo, de sambop, ou, como ele prefere, de "samba livre". Sua aparente discrição em alguns momentos, jamais escondeu o enorme talento do qual o samba-jazz há decadas tanto dele se orgulha.

John Lee é um portento de solidez e inventividade. O veterano baixista usa os recursos do instrumento elétrico para criar, exatamente a partir das diferenças deste com o primogênito acústico, linhas de walking preciosas, entremeadas de slaps e acordes que dão o acento certo, na hora certa.

Willie Jones III destacou-se por sua incrível versatilidade, não se deixando intimidar nem no samba, apesar de ter, a seu lado, nada mais nada menos, do que Duduka da Fonseca, nas jams do dia 20. O jovem baterista foi aluno de Billie Higgins, honrando a tradição de Philly Joe Jones e Jimmy Cobb, porém revelando severa influência, ainda, de Louis Hayes.

Roberta Gambarini, dignificou as sempre dificílimas Stardust e Day Dream, pecando, entretanto, nas canções em que aventurou-se pelo scat, dom que só a poucas rainhas do jazz foi concedido, entre elas Carmen Macrae, farol mais que evidente da italiana. Ressente-se ainda de um timbre mais atraente, embora sua técnica e personalidade denotem já uma cantora de induvidosa classe.
Após essas gloriosas performances, Hargrove parecia exausto já na madrugada de quinta, espraiado na escadaria do Mistura. Fumava quieto e olhava o vazio da rua.

Até hoje me pergunto quando, de novo, terei a ventura de esperar meu carro ao lado de um autêntico gênio do Jazz.

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