Newport celebra 50 anos voltando às raízes
Por Bill Beuttler, em 5 de agosto de 2004
(transcrito e traduzido livremente do jornal The Globe
online)
A grande história acerca do aniversário dos 50 anos do festival de jazz de Newport pode parecer ligeiramente óbvia para aqueles não familiarizados com os festivais passados.
"Vou voltar ao jazz", diz George Wein, o promotor dos concertos, que tem estado à frente de todos os festivais em Newport, até hoje. "Quero ver se há de fato suficientes fans de jazz, sem trazer nomes do
pop ou do
crossover.
Ao longo dos anos, Wein, 78, desafiou a ira dos puristas do jazz (e de fato a colheu, por algumas vezes) ao programar
rythm&blues,
fusion e outros gêneros populares junto com o jazz mais puro, nos seus diversos festivais no mundo todo, incluindo Newport. A idéia era alargar a tenda, aumentar a receita da venda de ingressos e talvez transformar alguns neófitos, atraídos por outras apresentações, em novos fans de jazz.
Mas não haverá essa mescla no festival deste ano - agora chamado oficialmente de
JVC Jazz Festival-Newport - que começa na próxima quarta-feira e vai até 15 de agosto, no Fort Adams State Park, em Newport, no Estado de Rhode Island.
"Decidi mudar a fórmula este ano", diz Wein. "Foi o jazz que fez o festival de Newport ser um grande festival, então vamos brindar ao jazz no quinquagésimo ano!"
Assim será o brinde ao jazz: entre os destaques deste ano estão tributos a vários dos maiores personagens do passado do jazz. A "
Jon Faddis Jazz Orchestra" saudará a Dizzy Gillespie, Charlie Parker, Benny Goodman e Count Basie no sábado, seguida por
Wynton Marsalis e a "Lincoln Center Jazz Orchestra" homenageando a Duke Ellington, Thelonious Monk e Louis Armstrong no domingo. Outros grupos menores farão tributos a Monk (de novo), John Coltrane, Art Blakey e a Herbie Nichols.
Sobreviventes "petardos" de festivais passados estão incluídos neste, como o baixista
Percy Heath e o sax-alto
Lee Konitz, ambos presentes ao primeiro Newport Jazz Festival, em 1954;
Dave Brubeck, cuja estréia em Newport foi no ano seguinte; e o baterista
Chico Hamilton, que estava entre os artistas que figuraram no famoso filme-documentário sobre o festival de 1958, "Jazz on a Summer's Day".
Além disso, neste ano um terceiro palco está sendo adicionado ao dois usuais, onde vão apresentar-se uma dúzia dos melhores pianistas de jazz da atualidade, em trabalho solo.
Tudo isso custa dinheiro, motivo pelo qual os fans do jazz enfrentarão preços de entradas mais caros este ano. "Não estamos sentindo nenhuma resistência aos preços, que ainda estão baixos comparados aos dos concertos pop," diz Wein. "Não é que nenhum dos artistas custe uma fortuna mas nosso orçamento é o maior que jamais tivemos porque estamos pagando talvez a 80, 90 pessoas, e pagando muito bem. Temos duas "big-bands" que nos custam bem caro, mais
Herbie Hancock e
Ornette Coleman e
McCoy Tyner, uma outra banda "all-star", três tendas e três palcos."
DESTAQUES:
Dave Brubeck
O próprio Mr. "Take Five" abrirá as festividades deste ano, na Rogers High School de Newport, acompanhado do sax-barítono
Kevin Deas, do cantor
Alberto Mizrahi e dos
Providence Singers, com sua composição sacra de larga escala, "The Gates of Justice". Brubeck escreveu a cantata em 1969, por encomenda da "Union of Hebrew Congregations" e do "College Conservatory of Music of the University of Cincinnati", para celebrar os percalços comuns de judeus e afro-americanos. Brubeck, 83, também tocará com seu quarteto no dia 14, no JVC Jazz Stage, no Fort Adams State Park.
Harry Connick Jr.
A coisa mais próxima de um "pop-star" no festival deste ano, a performance da "big-band" de Connick na sexta,13, à noite, no Newport Casino, está totalmente vendida. Connick tocará piano jazzístico também no dia 14, com seu quarteto, no palco principal JVC, repetindo com seu conjunto instrumental (e repita-se, desprovido de voz) seu CD do ano passado "Other Hours".
John Coltrane Remembered
Trane e seu legendário quarteto do início dos anos 60 serão homenageados no palco JVC no sábado, por um dos mais destacados tenoristas e discípulo de Coltrane,
Michael Brecker, junto com o filho [do mestre]
Ravi Coltrane, dividindo os trabalhos no sax.
McCoy Tyner vai tocar como ele mesmo ao piano,
Christian McBride substituirá o falecido Jimmy Garrison no baixo e
Roy Haynes tomará o lugar do recentemente falecido Elvin Jones na bateria. É uma formação que promete fazer desta apresentação algo memorável.
Branford Marsalis Quartet
O selo de gravação de
Branford Marsalis, Marsalis Music, de Cambridge, vai fazer um barulhão em Newport este ano. Os parceiros de selo
Connick e
Doug Wamble obtiveram vagas no sábado e no domingo, respectivamente, no Dunkin' Donuts Stage. E quando Branford subir ao palco JVC com seu quarteto e o convidado
Miguel Zenón no sábado, três outros artistas estarão representando o selo: Zenón, o pianista
Joey Calderazzo (cujo CD, em piano solo "Haiku", saiu esta semana) e o próprio
Branford Marsalis Quartet, cujo CD de baladas melancólicas "Eternal", está com seu lançamento previsto para 14 de setembro. O quarteto - com Marsalis nos saxes tenor e soprano, Calderazzo no piano,
Eric Reavis no baixo e
Jeff "Tain" Watts na bateria - está entre os mais afiados combos de jazz, com apresentações constantes.
Lincoln Center Jazz Orchestra com Wynton Marsalis
No domingo, o irmão de Branford, Wynton, lidera uma saudação a três grandes criadores do panteão do jazz: Duke Ellington, Thelonious Monk e Louis Armstrong. Juntando-se ao trompetista Marsalis e sua orquestra, como convidados especiais, estarão o saxofonista
James Carter, a violinista
Regina Carter, o trompetista
Nicholas Payton e o venerável trompetista/flugelhornista
Clark Terry, que marcou ponto por quase uma década na seção de trompetes da orquestra de Duke Ellington.
Ornette Coleman Quartet
O saxofonista-alto Coleman entrou na cena do jazz de uma maneira grandemente controversa em 1959, portanto cinco anos depois do primeiro Newport, onde não se apresentou senão em 1971. Pode não ter modificado sozinho a forma do jazz desde então mas é indiscutivelmente um dos mais inovadores compositores do gênero. Atualmente seu quarteto está formado por seu filho
Denardo Coleman, na bateria e por uma dupla de baixistas,
Tony Falanga e
Greg Cohen.
(isso sim é ser diferente!)
Herbie Hancock, Wayne Shorter, Dave Holland e Brian Blade
Este super-grupo desconta a curiosa omissão de Miles Davis entre os maiorais do jazz escolhidos para serem homenageados nessa festa em Newport. O pianista
Hancock e o saxofonista
Shorter tocaram juntos no famoso quinteto de Miles dos anos 60, junto ao baixista
Ron Carter (que vai fazer duas aparições em Newport este ano) e com o falecido baterista Tony Williams.
Holland substitui Carter no quinteto e como todos os demais, que continuaram por décadas de estrelato em posições de líderes, Holland vem abocanhando uma série de premiações. O garoto novo é o baterista
Blade, uma estrela em ascensão, que já acompanhou todo mundo, de Joshua Redman a Joni Mitchell.
(Se você leitor(a) amante de jazz, estiver com o passaporte em dia e com algumas economias repousando no fundo de renda fixa ou em outro escaninho financeiro - que não lhe dá nenhum prazer "at all", exceto saber que elas estão ali para alguma "necessidade" - mande tudo às favas e parta já para ver esse que poderá ser um dos últimos grandes encontros de sumidades do verdadeiro jazz. Alguns, como Dave Brubeck, Percy Heath, Roy Haynes, Lee Konitz, Clark Terry e Chico Hamilton, "masters" em todas as acepções da palavra, não vão poder se apresentar por muito mais tempo, que dirá num mesmo lugar. Então, esse Newport "cinqüentinha" desde já se afigura, historicamente, monumental. Enlouqueça, dê-se esse prêmio, vá!) M.N.