Mauro Nahoum (Mau Nah), José Sá Filho (Sazz), Arlindo Coutinho (Mestre Goltinho); David Benechis (Mestre Bené-X), José Domingos Raffaelli (Mestre Raf) *in memoriam*, Marcelo Carvalho (Marcelón), Marcelo Siqueira (Marcelink), Luciana Pegorer (PegLu), Mario Vieira (Manim), Luiz Carlos Antunes (Mestre Llulla) *in memoriam*, Ivan Monteiro (Mestre I-Vans), Mario Jorge Jacques (Mestre MaJor), Gustavo Cunha (Guzz), José Flavio Garcia (JoFla), Alberto Kessel (BKessel), Gilberto Brasil (BraGil), Reinaldo Figueiredo (Raynaldo), Claudia Fialho (LaClaudia), Pedro Wahmann (PWham), Nelson Reis (Nels), Pedro Cardoso (o Apóstolo), Carlos Augusto Tibau (Tibau), Flavio Raffaelli (Flavim), Luiz Fernando Senna (Senna) *in memoriam*, Cris Senna (Cris), Jorge Noronha (JN), Sérgio Tavares de Castro (Blue Serge) e Geraldo Guimarães (Gerry).

MARKOS RESENDE QUARTETO - XI CHIVAS JAZZ LOUNGE

22 junho 2004

Alguns imaginaram uma viagem pelo túnel do tempo. Outros, uma volta de puro encantamento à terra da nostalgia. Estavam enganados. Nem uma coisa, nem outra.

O tributo ao compositor Richard Rodgers, com o quarteto do pianista Markos Resende, trouxe ares do passado em cores vivas do presente no XI CHIVAS JAZZ LOUNGE, produzido por José Flávio Garcia, celebrando em grande gala o primeiro ano de atividade da iniciativa plenamente vitoriosa do grupo de amigos do CJUB nos palcos cariocas.

José Flávio convocou o pianista Markos Resende, que convocou para o conjunto três ótimos coadjuvantes de São Paulo: Daniel D’Alcântara (trompete e flugelhorn), o altamente promissor Alberto Lucas (baixo) e o americano Bobby Wyatt (bateria), muito conhecido do público carioca, pois morou e tocou no Rio na primeira metade dos anos 80.

Como desde a primeira edição do projeto CHIVAS JAZZ LOUNGE, o público prestigiou o evento. Uma aura de magia parecia estar no ar, como um pressentimento coletivo do que estava por vir, e isso se justificava. A acertada escolha das músicas de Richard Rodgers, integrante do seleto círculo de compositores da música popular americana, ao lado de George Gershwin, Cole Porter, Jerome Kern, Irving Berlin e Harold Arlen - lembrando que o genial Duke Ellington foi uma entidade inteiramente à parte –, era a garantia para a maioria da audiência identificar suas melodias imorredouras.

A despeito da afirmação no primeiro parágrafo, pelo menos para mim, a noite representou uma viagem por minha própria conta.

Voltei ao passado, lembrando quando assisti fascinado ao filme “Words and Music” focalizando a vida e a obra da dupla Richard Rodgers e Lorenz Hart. Uma autêntica reprise trouxe à minha memória algumas cenas marcantes desse inesquecível musical, desfilando canções que ficaram para a eternidade nas vozes de artistas e cantores em grande evidência na época. As cenas com Mel Tormé cantando “Blue Moon”, que, segundo suas próprias palavras, foi o turning point da sua carreira... Mickey Rooney, coadjuvado por Tom Drake e Marshall Thompson, interpretando “Manhattan”, que ficaria associada a ele por toda vida ... “The Lady Is A Tramp” e “Where or When”, pela graciosa e encantadora Lena Horne... “Blue Room”, pelo sóbrio e sempre elegante Perry Como...; “Thou Swell”, por June Allyson, uma das atrizes mais populares dos musicais de Hollywood ... Foram recordações que marcaram indelevelmente minha vida de adolescente.

Sonhando acordado, absorto nesse íntimo retrocesso no tempo, inteiramente alheio ao mundo exterior, subitamente volto à realidade com a voz de José Flávio anunciando o concerto. Ainda emocionado pela digressão ao passado, demorei um pouco a recompor-me, lamentando que a era dos grandes musicais do cinema ficaram definitivamente para trás.

Com seu savoir faire e sua experiência de microfone, José Flávio faz uma apresentação impecável, aludindo à importância da música imortal do homenageado no contexto da arte musical do Século XX.

Apresentados os músicos, o quarteto de Markos Resende abre a noite com uma lírica introdução da belíssima “My Romance”, eternizada pelo pianista Bill Evans, adiante balanceada por alterações e variações do andamento.

Seguem-se “My Favorite Things” (identificada imediatamente pelo público devido à popularidade da trilha do filme “A Noviça Rebelde”, imortalizada no jazz pela longa versão de John Coltrane) e a eterna “My Funny Valentine” (carro-chefe de Chet Baker que o guindou do anonimato para a fama em menos de um ano), valorizada pelo tratamento emocional de Daniel D’Alcântara, construindo uma improvisação no mais amplo sentido melódico-harmônico, dosando e permeando habilmente seu discurso com espaços e pausas cujos significados são tão importantes quanto as notas executadas, evitando a enxurrada de notas que muitos empregam para camuflar falta de idéias.

Na seqüência, uma das duas surpresas fora da programação: o cantor Nando Gabrielli, que se auto-intitula “o Frank Sinatra brasileiro”, empolgou o público em “The Lady Is A Tramp”, com direito a longo scat vocal e um final agudo beirando a grandiloqüência melodramática.

Duas pérolas de Rodgers abriram o segundo set: "Bewitched", com o introspectivo piano do líder em destaque, superiormente acompanhado por Lucas – baixista de raro bom gosto, excelente escolha de notas e imaginação - e Wyatt, que, embora avesso a extroversões, com sua incessante polirritmia conhece a ciência exata de quando deve e quando não deve acentuar, fornecendo o impecável apoio rítmico na melhor tradição dos grandes bateristas. Outra jóia foi “I Didn’t Know What Time It Was”, exposta por Lucas com justeza de técnica e perfeita entonação, reafirmando sua presença na constelação dos baixistas nacionais.

Lover” - originalmente uma valsa, eternizada no jazz pelas efervescentes versões de Stan Kenton e Gene Krupa - foi um tour de force em andamento supersônico, com longa troca de quatro compassos entre Resende, Daniel, Lucas e Wyatt, este sempre evidenciando ser um mestre da subdivisão rítmica.

A segunda surpresa foi a presença da cantora Leila Maria numa versão de “Blue Moon”, com engenhosa citação de “Stormy Weather” encaixada pelo trompetista Daniel utilizando a mão à guisa de surdina plunger. Leila é discípula confessa de Billie Holiday no que concerne à divisão peculiar do fraseado, inflexões e acentuações nas terminações das frases, porém seu poderoso volume vocal contrasta diametralmente com o caráter intimista da extraordinária criadora de “God Bless the Child”, precisando controlar a excitação por vezes exagerada das suas interpretações. Leila atendeu à ovação da platéia oferecendo o clássico “Misty”, de Erroll Garner, muito mais contida e mais natural, criando um clima emocional de real sensibilidade.

Terminada a música, o cejubiano Arlindo Coutinho surpreendeu e emocionou Leila Maria ao informá-la que seu novo CD foi avalizado pelos executivos da Sony Music para integrar um dos seus próximos lançamentos, fato que ela desconhecia.

Para surpresa de muitos, uma versão de “O Amor em Paz”, de Tom Jobim, embelezada por ornamentos melódicos e evocativos das frases de Markos, encerrou o tributo a Richard Rodgers; o estilo de Daniel, desta feita no flugelhorn, ressurgiu como uma amálgama das melhores qualidades requeridas para um improvisador, projetando seu domínio da massa sonora do instrumento e sua técnica apropriadamente desenvolvida para a improvisação melódica, descartando o óbvio e o supérfluo, seguido atentamente por Lucas e Wyatt em todos os seus movimentos, contribuindo para uma das mais emotivas interpretações ouvidas nos concertos do Projeto CHIVAS JAZZ LOUNGE.

Nenhum comentário: